BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - Após uma participação incômoda para o Brasil no G20, a Argentina do presidente Javier Milei afirmou em comunicado oficial na tarde desta segunda (18) que assinaria o documento final do encontro, mas que marcaria sua oposição a trechos da declaração.
"Chegou a hora de reconhecer que o atual sistema de cooperação internacional está em crise, porque faz tempo que está em dissonância com seu propósito original", escreveu a Presidência argentina. O propósito, diz, é resguardar os direitos básicos das pessoas.
"Sem bloquear a declaração dos demais líderes", disse o governo ultraliberal, Milei apontou sua discordância com o que chama de "a limitação da liberdade de expressão nas redes" e "a noção de que uma maior intervenção estatal é uma forma de lutar contra a fome".
Como a Folha de S.Paulo mostrou, a Argentina de Milei marcou oposição em diferentes trechos na declaração de líderes negociada no Rio de Janeiro nos últimos dias, complicando as tratativas, como esperado.
Em seu discurso aos chefes de Estado e de governo, Milei disse que sua administração "nunca vai defender propostas que tragam maior pressão fiscal ou de desenvolvimento sustentável que priorizem caprichos de políticos com a pança cheia em países ricos, quando os países pobres precisam explorar seus recursos para sair da pobreza".
Por outro lado, após discordâncias, Buenos Aires cedeu e entrou na Aliança Global contra a Fome a Pobreza proposta pelo presidente de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como legado para o G20.
Mas a contrariedade ficou clara no comunicado da Casa Rosada. "Cada vez que se tentou combater a fome e a pobreza com medidas que aumentam a presença do Estado na economia o resultado foi o êxodo tanto da população como do capital, além de milhões de mortes de vidas humanas", disse o texto, na linguagem típica do governo.
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"Se queremos lutar contra a fome e erradicar a pobreza, a solução está em tirar o Estado desse meio", seguiu o comunicado. "Desregular a atividade econômica para liberar o mercado e facilitar o comércio. O capitalismo de livre mercado já tirou da pobreza extrema 90% da população global e duplicou a expectativa de vida."
A Argentina tem 13% de sua população em situação de insegurança alimentar severa, segundo dados de 2022 da ONU. Com a queda do consumo, analistas projetam que esse dado crescerá em 2024. Já a pobreza atinge 52% da população argentina.
"Este governo mantém a fé e a esperança de que a comunidade internacional se reencontre nos princípios que lhe deram a vida", concluiu a Presidência de Milei no comunicado oficial.
Em seu discurso, Milei enfatizou: "Repito: a única coisa que funciona para tirar milhões da pobreza é o capitalismo, qualquer outra é arrogância para confortar ou financiar sociólogos mal formados e desonestos". Terminou pedindo que Deus abençoe o "mundo livre".
O texto acordado no G20 apoia o comprometimento com igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas. Mas consta a observação [ARG:reserve], indicando a oposição argentina.
Também houve discordância argentina sobre a taxação dos chamados super-ricos e sobre um trecho que trata da desinformação e do discurso de ódio no ambiente virtual.
Havia certo temor entre as equipes diplomáticas de que o governo argentino bloqueasse um consenso no G20. A Casa Rosada tem sido um fator complicador em órgãos multilaterais por sua oposição à Agenda 2030, de objetivos do desenvolvimento sustentável da ONU.
Propostas de defesa da igualdade de gênero, de combate à emergência climática e de luta contra a fome têm tido trechos bloqueados.
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Em outubro, Milei enviou carta a toda a sua equipe diplomática afirmando que os diplomatas que apoiassem qualquer declaração, resolução ou projeto que endossasse a Agenda 2030 ou objetivos da entidade, seriam instados a se retirar. O comunicado foi enviado aos diplomatas antes da demissão da chanceler Diana Mondino por apoiar resolução da ONU contra o embargo de Cuba pelos Estados Unidos.