Já na mira da regulamentação em instância federal, as ‘bets’ são tema de propostas também na esfera estadual em Minas Gerais. Dois projetos protocolados na Assembleia Legislativa (ALMG) estabelecem regras para limitar a publicidade de serviços de apostas e criar campanhas educativas para crianças e adolescentes sobre os riscos atrelados à prática que vive atualmente seu auge de movimentação financeira no país.
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Os dois projetos de lei (PLs) foram protocolados no Legislativo mineiro pela deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT). O primeiro deles é o PL 3.017/2024, que propõe a criação da campanha estadual de conscientização sobre os malefícios e riscos dos jogos de azar e apostas on-line nas escolas públicas e privadas do estado.
O projeto prevê o desenvolvimento de materiais pedagógicos e criação de palestras, debates e oficinas para conscientização sobre os riscos dos jogos de azar online. A proposta também determina que os profissionais da educação recebam formação para reconhecer sinais de uso problemático e comportamento de risco dos alunos em relação às bets.
A justificativa apresentada pela parlamentar cita especificamente um tipo de serviço conhecido como “jogo do tigrinho”. Segundo Cerqueira, esta modalidade de apostas online tem uma atratividade particular para os jovens.
“O ‘jogo do tigrinho’ ou slot game é um exemplo dessa modalidade de jogos, atraente para a curiosidade e impulsividade de crianças e adolescentes, alardeado nas redes sociais, como no instagram. A exposição a ambientes de jogos de azar pode ser considerada uma violação dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, acarretando sanções administrativas e penais, conforme previsto no art. 243 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente)”, diz trecho do texto.
Já o PL 3.033/2024 proíbe a publicidade e promoção de apostas e jogos online em Minas Gerais. A regra vale não apenas para propagandas em veículos de mídia e publicidade em locais públicos como outdoors, mas também o patrocínio em eventos esportivos, cívicos, culturais, de qualquer espécie, bem como a clubes, entidades, empresas ou quaisquer instituições, sejam de caráter público ou privado.
Entre as punições para o descumprimento da lei, caso o texto seja aprovado, estão previstas advertências, suspensão temporária de atividades publicitárias no estado e multas por infração de 3 mil Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais (UFEMG), hoje avaliada em cerca de R$ 5,28. As sanções se estendem para empresas de tecnologia e operadoras de internet que facilitarem a propagação de anúncios de apostas em plataformas digitais.
Mais ousado, o PL 3.033/2024 encontrará pela frente uma inundação de bets nos veículos midiáticos e instituições com forte apelo popular. Entre os clubes de futebol masculino das séries A, B e C do Campeonato Brasileiro, por exemplo, 52 dos 60 integrantes têm como patrocinador alguma empresa de apostas online, conforme publicação feita em outubro pelo Banco do Brasil.
Até mesmo pontos tradicionais das cidades, como o quase centenário Mercado Central em Belo Horizonte, recebem patrocínios de servidores de apostas esportivas. Recentemente, o ponto turístico da capital mineira alterou seus ‘naming rights’ para incluir a marca da KTO na designação.
Ambos os projetos apresentados por Beatriz Cerqueira foram protocolados na Assembleia na primeira quinzena de novembro e ainda não chegaram às primeiras fases de apreciação pelos deputados. Os textos devem ainda passar pelas comissões temáticas antes de ser votado em dois turnos no plenário da Casa.
Expansão das bets
A discussão sobre a regulamentação das bets no Brasil têm movimentado a esfera pública nos últimos meses. O tema é avaliado sob dois prismas principais: o econômico e o social. O primeiro diz respeito ao potencial de arrecadação atrelado ao mercado das apostas que já movimenta bilhões de reais no país. O segundo diz respeito ao comportamento compulsivo de alguns apostadores que resulta no endividamento das famílias e até no comprometimento da saúde mental.
Enquanto governo federal e Congresso Nacional discutem o assunto, o Instituto DataSenado divulgou em outubro dados sobre o perfil do apostador e o impacto das bets no orçamento das famílias no país. O levantamento mostrou que 13% dos brasileiros com 16 anos ou mais, cerca de 22 milhões de habitantes, declarou ter participado deste mercado nos últimos 30 dias.
A pesquisa mostrou ainda que mais da metade (52%) dos apostadores recebe até dois salários-mínimos mensais. A maior parte também diz ter gastado até R$ 500 em aplicativos ou sites de bets. O levantamento ainda mostra que 58% dos apostadores afirmam ter dívidas em atraso por mais de 90 dias.
As apostas online no Brasil foram permitidas via medida provisória (MP) assinada pelo então presidente Michel Temer (MDB) em 2018. A primeira regulação do mercado só aconteceu no ano passado com a Lei 14.790, aprovada em dezembro de 2023. O texto no entanto, versa apenas sobre o estabelecimento das apostas de quota fixa, quando o cliente tem conhecimento da taxa de retorno antes de jogar.