O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve os benefícios da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid nesta quinta-feira, 21. A decisão foi tomada depois de um depoimento prestado pelo ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro por quase três horas.

Para Moraes, Cid esclareceu as omissões e contradições apontadas pela PF. Os investigadores haviam sinalizado ser favoráveis à rescisão do acordo porque, nos depoimentos prestados durante a delação, o tenente-coronel teria protegido Bolsonaro e o general Walter Braga Netto, que foi ministro-chefe da Casa Civil e da Defesa no governo passado e, depois, candidato a vice na chapa derrotada em 2022.

Além de Moraes, estavam presentes ao depoimento de Cid nesta quinta no STF representantes da Polícia Federal. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, acompanhou por videoconferência. As declarações do delator foram suficientes para fazer com que Gonet, que havia sido favorável à anulação do acordo, concordasse com a manutenção dos benefícios.

Foi o segundo depoimento de Cid nesta semana. Na terça-feira, ele falou à Polícia Federal. O interrogatório ocorreu horas depois da operação em que quatro militares e um agente federal foram presos por, segundo a PF, planejarem o assassinato do presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e de Alexandre de Moraes.

O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro negou, na ocasião, ter conhecimento sobre o plano. As investigações mostravam, no entanto, que Cid havia participado de uma reunião na casa de Braga Netto para tratar do golpe no dia 12 de novembro de 2022. Ele teria participado, também, de outros atos preparatórios.

O advogado Cézar Bittencourt, que defende Mauro Cid, disse ao PlatôBR que Moraes perguntou especificamente sobre a relação entre Braga Netto e Bolsonaro. “Meu cliente explicou que o general era um dos principais assessores do presidente, a ponto de ambos se reunirem todas as tardes”, explicou. Ele negou que tenha havido qualquer contradição entre as declarações de de Mauro Cid ao longo da colaboração.

O depoimento a Alexandre de Moraes começou praticamente no mesmo momento em que a PF divulgou a conclusão do relatório final das investigações sobre a tentativa de golpe. Mauro Cid é um dos 37 indiciados. O documento, de mais de 800 páginas, deve ser encaminhado por Alexandre de Moraes para a PGR nos próximos dias.

A delação
Mauro Cid fechou o acordo de delação em setembro de 2023, depois de passar quatro meses preso. A prisão havia sido decretada na investigação sobre a falsificação dos cartões de vacina. Ele foi preso novamente em março deste ano, depois do vazamento de áudios de uma conversa em que fazia ataques à PF e ao STF — à época, foi acusado de ter descumprido o acordo de delação. Em maio, ganhou a liberdade novamente, por decisão de Moraes.

Como muitas informações que embasaram as investigações tinham origem em dados extraídos do celular do ex-ajudante de ordens, os policiais federais consideraram que ele havia omitido fatos relevantes. Para o coordenador do curso de Direito da ESPM, Marcelo Crespo, mestre em direito penal, um possível cancelamento da delação não traria prejuízos para a investigação, uma vez que não apagaria as informações obtidas. “A delação é um instrumento importante no começo da investigação, mas vai perdendo importância na medida que o trabalho avança, com o surgimento de novas provas”, diz.

Para Crespo, nesta fase, o mais importante é a polícia e a Justiça buscarem novas informações, confirmarem detalhes e eliminarem dúvidas. É um momento em que o cancelamento pode prejudicar mais o acusado do que as investigações. “Se a delação for anulada, as próprias informações passadas podem ser usadas contra ele”, afirma.

Além de incriminar a si mesmo, se tivesse os benefícios de sua delação cancelados, Cid poderia complicar sua esposa e de seu pai, o general da reserva Mauro Cid, também investigados pela PF — sobre a suspeita de falsificação dos comprovantes de vacina da Covid-19 e sobre a venda irregular de joias recebidas de autoridades estrangeiras por Bolsonaro.

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