As letras frias das atas que registraram as cerimônias de posse do Executivo e Legislativo e a eleição do novo presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte não expressam a variação de comportamento geral dos que estiveram presentes na Casa na tarde do primeiro dia de 2025. Entre 14h e 18h, o plenário repleto de vereadores e seus convidados deu espaço a consternação, solidariedade, admiração, euforia, zombaria e ressentimento.
Com a saúde debilitada, Fuad Noman (PSD) não compareceu ao evento e participou via videoconferência. De máscara, ao lado da esposa, o prefeito reeleito proferiu o juramento da posse com dificuldades para se fazer compreendido e terminou sua participação virtual sob longos aplausos de todos os presentes. O vice-prefeito Álvaro Damião (União Brasil) foi ao microfone do plenário na sequência e leu um longo discurso escrito pelo companheiro de chapa, foi cortado por mais palmas e terminou o texto com a voz embargada por lágrimas.
A aura de respeito e solidariedade prosseguiu no plenário na posse dos vereadores e nas primeiras falas para encaminhamento dos votos na eleição, quando votos pela plena recuperação foram dirigidos ao prefeito. A situação começou a mudar quando os vereadores, em ordem alfabética, passaram a registrar seus votos nas chapas concorrentes à presidência, uma encabeçada pelo líder governista Bruno Miranda (PDT) e outra pelo decano da Casa, Juliano Lopes (Podemos).
Conforme esperado, a vitória veio para Lopes com o placar de 23 a 18, apesar das intensas articulações feitas pela prefeitura nos suspiros finais de 2024. Com ele à frente, a mesa diretora terá outra figura central no bolsonarista Pablo Almeida (PL), que assume como secretário geral. Articulados pelo secretário-chefe da Casa Civil do governo estadual, Marcelo Aro (PP), o grupo vencedor comemorou efusivamente a vitória, como lhes é de direito, claro.
Gritos de “Família Aro neles” passaram a ecoar no plenário enquanto ao homem forte da articulação do governador Romeu Zema (Novo) formava-se uma pequena aglomeração para cumprimentá-lo, incluindo opositores. Mãe de Marcelo, a vereadora Professora Marli (PP) foi ao microfone para dizer que seu filho é o único homem digno de ser chamado de ‘articulador político’ em Minas Gerais.
Enquanto os vereadores justificavam seus votos, na outra extremidade do plenário, um banner com o rosto de Damião foi estendido. Ao lado da imagem do vice-prefeito lia-se “A gente gostaria de uma chapa única na próxima quarta-feira. O Bruno [Miranda] já tem votos para vencer a eleição, então a gente espera que a gente consiga uma unanimidade", frase dita na semana final do ano em um programa de rádio. Ninguém quis assumir a autoria do cartaz zombatório, mas apoiadores de Aro aproveitaram para se fotografar ao lado da imagem, caso da deputada federal e ex-presidente da Câmara Nely Aquino (Podemos).
Com mais raiva e ainda algum deboche, o ex-presidente da Câmara, Gabriel Azevedo (MDB) também foi alvo do grupo. A vereadora Flávia Borja ironizou a antiga cadeira usada por Afonso Pena e resgatada por Azevedo e disse que o antigo colega se sentava em um trono e tratava-se de “um reizinho que se dizia democrata, mas era um ditador”.
Em entrevista coletiva, já eleito, Juliano Lopes também criticou Azevedo. Além dele, o novo presidente da Casa classificou Lucas Ganem (Podemos), Edmar Branco (PCdoB) - que mudaram seus votos após anunciar apoio ao grupo de Aro - e Bruno Miranda como “os três traíras”. Ele ainda disse que Damião encabeça uma lista de “três patetas”, cujos dois outros integrantes o parlamentar não quis revelar. À boca miúda, os nomes ventilados eram os do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), e do deputado estadual e radialista João Vítor Xavier (Cidadania).
Nos próximos meses a nova composição de poder da Câmara começará a trilhar seu novo caminho. As incógnitas ainda são se esta trilha será menos ou mais próximas das da prefeitura ou se seguirão paralelas ou em sentidos opostos. Fica também a dúvida para saber o quanto os fantasmas do passado seguirão presentes.
Wagner Ferreira prestigiado
Juliano Lopes fez seu primeiro discurso como presidente da Câmara sob o olhar atento de Marcelo Aro, que o assistiu do fundo do plenário com poucas palavras. Uma das raras manifestações do secretário de Zema se deu quando o vereador agradeceu o voto de Wagner Ferreira (PV), único nome da esquerda a não apoiar Bruno Miranda. A menção ao parlamentar terminou acompanhada de um grito de “gigante”, vindo do principal articulador da chapa vencedora na eleição para a mesa diretora da Casa.
Bolsonarista na mesa
Embora tenha batido o nome governista na eleição pela presidência da Câmara, não é como se Juliano Lopes tivesse um histórico de ferrenha oposição a Fuad Noman. Também não é o caso de Marcelo Aro, que já teve seus indicados como secretários do prefeito. Neste contexto, o novo secretário geral, Pablo Almeida, deve ser a voz mais dissonante da do Executivo. Ao menos é essa a expectativa de seus correligionários que, empolgados, viram o colega subir à mesa diretora. Bolsonarista, ele foi eleito sob a marca de ser o candidato do deputado federal Nikolas Ferreira (PL).
Aro tergiversa
Há um ano, Fuad Noman tinha nomes indicados por Marcelo Aro ocupando suas secretarias de Governo, Educação, Meio Ambiente e Desenvolvimento Econômico. Agora, com um membro da ‘família’ ocupando a presidência da Câmara, um dos mistérios a ser desvendado é se Aro pretende, novamente, estender sua influência para o Executivo. Por ora, ele prefere escapar pela tangente. Ao ser perguntado sobre sua relação futura com a prefeitura, ele se evadiu com a resposta “isso tem que ser perguntado a eles”.