Copasa: 'Entre privatização e federalização, eu preferiria a privatização'
Fernando Passalio, presidente da Copasa, critica no podcast EM Entrevista a gestão de estatais pelo governo federal
Mais lidas
compartilhe
Siga noA gestão das empresas estatais está sempre entre as atribuições principais para qualquer governador mineiro e o cenário não foi diferente com Romeu Zema (Novo) no poder. É neste contexto que ele tem movimentado a estrutura de seu governo e colocado nomes de confiança de seu secretariado na administração das empresas. Um deles é Fernando Passalio, ex-titular da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (Sede) e remanejado para a presidência da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa).
Passalio é graduado em Administração e Gestão de Instituições Financeiras e pós-graduado em Auditoria Governamental. É formado também em Políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Medellín, na Colômbia.
Leia Mais
Em entrevista ao podcast EM Entrevista, do Estado de Minas, o novo chefe da companhia, empossado no fim de fevereiro, falou sobre as aspirações privatistas do Executivo para os ativos estatais e a perspectiva de federalização das empresas para abater a dívida com a União. Ele é contra a federalização. “Entre a privatização e a federalização, se isso estivesse na minha alçada, eu preferiria a privatização. Porque nós temos visto aí a gestão que o governo federal tem feito das estatais”, afirmou.
No comando da Sede, Passalio já participava da gestão das estatais, mas agora terá uma missão específica à frente da Copasa. Cenário semelhante ocorre com a ex-secretária de Planejamento e Gestão, Luísa Barreto (Novo) para presidir a Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge).
Questionado sobre seu possível papel pela privatização da companhia enquanto a preside, Passalio disse que passará a atuar neste sentido de acordo com o andamento do projeto enviado pelo Executivo estadual à Assembleia Legislativa para concessão da Copasa à iniciativa privada.
“Quando o dono, que é o estado, decide vender suas ações, precisa da anuência do parlamento. A Assembleia Legislativa precisa autorizar o sócio majoritário a vender. Esse é um assunto do governo estadual com o parlamento, com a Assembleia, que vai discutir as condições. Houve uma proposta inicial, todo mundo sabe, todo mundo acompanhou”, disse.
“O meu mandato é o seguinte: aquilo que for decidido e orientado pelo conselho, eu e o meu time de diretores estaremos lá para cumprir. Eventualmente, no processo de privatização, algumas rotinas entram no decorrer do nosso dia a dia de prestação de informações, audiências públicas. E nós estamos lá preparados para que esse processo seja o mais transparente possível”, ressaltou Passalio.
Referendo
Passalio se referiu aos projetos de lei entregues à Assembleia no fim do ano passado pelo vice-governador Mateus Simões (Novo) com propostas para privatização da Copasa e da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). As duas propostas ainda não foram apreciadas pelos deputados estaduais e tramitam concomitantemente com uma proposta de emenda à Constituição, essencial para o avanço das concessões.
“A privatização ainda é uma incerteza, porque depende de uma atuação do governo com a assembleia. O que temos de real hoje é uma gestão preocupada com o melhor serviço ao cidadão”
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/2023 determina a retirada da obrigatoriedade de um referendo para autorização da privatização de empresas estatais. A consulta popular integra a Constituição estadual desde 2001, quando o então governador Itamar Franco, apoiado unanimemente pela Assembleia Legislativa, aprovou a emenda ao texto como represália à venda de cerca de um terço das ações da Cemig realizada no governo anterior, de Eduardo Azeredo. Desde então, antes de conceder as estatais mineiras à iniciativa privada, o Executivo deve obter aprovação da maioria dos eleitores do estado.
Federalização
A empreitada privatista do governo Zema ocorre em meio ao momento em que as estatais de Minas Gerais são tratadas como trunfos importantes para o refinanciamento do débito de cerca de R$ 170 bilhões do estado junto à União. Sancionado parcialmente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no início do ano, o Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag) estabelece a federalização de ativos como forma de abater valores devidos e reduzir a taxa de juros cobradas sobre as parcelas que serão divididas em 30 anos.

Passalio se disse a postos para cumprir a designação do governo sobre o futuro da Copasa entre os dois caminhos que se apresentam. Ao falar sobre sua preferência, no entanto, o novo presidente da companhia manifestou sua predileção pela privatização em detrimento da federalização.
“Entre a privatização e a federalização, se isso estivesse na minha alçada, eu preferiria a privatização. Porque nós temos visto aí a gestão que o governo federal tem feito das estatais. As empresas têm sido sucateadas e dão prejuízo”, critica. “Com uma empresa que está hoje redondinha e com um plano de investimentos ousado na mão de um governo eventualmente irresponsável, nós podemos ter problema de não conseguir cumprir o marco do saneamento. No caso de uma privatização, eu acho que isso seria muito mais bem atingido”, avaliou.
Dívida
Idealizado pelo então presidente do Congresso Nacional, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em parceria com deputados estaduais, governadores e a equipe econômica do governo federal, o Propag prevê o parcelamento das dívidas dos estados com a União em 30 anos. O valor a ser pago pode ser abatido com a federalização de ativos estatais e os juros cobrados sobre as parcelas também podem ser fixados em uma taxa menor de acordo com a adequação das unidades federativas aos moldes do projeto.
“A PPP [parceria público-privada] vai permitir que empresas privadas possam atuar fazendo os investimentos numa velocidade maior do que a Copasa faria, para que a gente chegue ao final do processo tendo o saneamento básico entregue”
Atualmente, os juros aplicados às dívidas estaduais estão fixados no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais uma taxa de 4% ao ano. Esse percentual pode ser progressivamente reduzido a partir de medidas como o abatimento de até 20% do estoque da dívida com a federalização de estatais. Passalio afirma que, em paralelo à privatização, trabalha com esse objetivo, mas ainda aguarda uma sinalização do governo federal sobre a aceitação dos ativos.
“Até alguns dias atrás, eu estava no grupo que está fazendo os estudos para que tipo de ativos a gente pode oferecer à União. A dívida está em torno de R$ 165 bilhões. O governo precisa chegar a um número próximo de R$ 35 bilhões para abater a dívida e ter uma redução da taxa de juros”, detalhou Passalio.
“Com a redução da taxa de juros, o governo ganha uma previsibilidade de que a dívida não vai aumentar tanto quanto aumenta. [...] O mais importante nesse processo é, primeiro, o governo federal decidir se vai aceitar ou não o ativo que vai ser oferecido. Não temos ainda uma sinalização de quais ativos serão ou não aceitos”, declarou o presidente da Copasa.
Contratos
Além da indefinição vinda de Brasília, dentro da própria empresa não há um número fechado sobre o valor de mercado da Copasa. Segundo Passalio, a determinação de quanto a companhia poderá abater da dívida mineira varia de acordo com o número de contratos vigentes com as prefeituras de cidades mineiras.
“Com a redução da taxa de juros, o governo ganha previsibilidade de que a dívida não vai aumentar tanto. O mais importante nesse processo é o governo federal decidir se vai aceitar ou não o ativo que vai ser oferecido”
“A gente ainda não tem esse valor, porque todos os dias tem trabalhado na renovação dos contratos municipais. O saneamento básico é uma função precípua do município. O governo de Minas tem uma empresa chamada Copasa para que os prefeitos possam contratar e fazer o saneamento básico. Nosso cliente em primeiro grau é o prefeito, que quer estruturar o saneamento básico no município. Ele contrata a Copasa, que passa a operar. Tanto que a Copasa está em 640 municípios aproximadamente A empresa vale os contratos que ela tem”, explicou.
Abastecimento
Alvo de questionamentos da oposição na Assembleia Legislativa, a tentativa de privatização da Copasa é apontada como um fator de risco ao abastecimento hídrico em regiões recônditas e mais pobres do estado. Sobre este tema, Passalio afirma que a empresa que eventualmente assumir a companhia continuaria atuando sob a fiscalização da Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais (Arsae-MG), o que, na visão do gestor, garantiria o abastecimento em todo o estado.
“A Copasa sendo pública ou privada, é regulada por uma agência independente, a Arsae. Essa agência independente zela pelo cumprimento da atividade que a Copasa tem nos municípios. Numa eventual privatização, entendo que a ligação já está feita, a estrutura já está pronta, seria só o avanço dos investimentos. Não tem como haver abandono da empresa nesses municípios menores. Não vejo o menor sentido nessa preocupação, é uma narrativa até infeliz que a oposição tenta colocar. É um serviço regulado, a empresa vive de tratar esgoto e vender água, então, não tem porque recusar clientes. As estruturas já estão postas na sua grande maioria”, opinou Passalio.
Fiscalização
O presidente da Copasa ainda afirmou que o projeto de privatização enviado pelo governo Zema à Assembleia não prevê nenhuma função do Executivo estadual na fiscalização da atuação da empresa de saneamento básico. “Hoje, a Arsae faz a regulação do serviço de saneamento da Copasa. O projeto de lei não traz nenhum tipo de alteração na agência que vai fazer a regulação do serviço. Uma coisa é quem vai ser o acionista majoritário da empresa. Outra coisa é a empresa, independentemente de quem é o acionista majoritário, ter que se submeter a uma agência reguladora independente e que é bem firme naquilo que preserve a qualidade do serviço”, garantiu.
Leilão
Enquanto a privatização da Copasa esbarra nos trâmites da Assembleia Legislativa, a direção da empresa já trabalha com a viabilidade de leilões para estruturas que já contam com o apoio de investimentos privados. Um exemplo é a parceria público-privada (PPP) do Projeto Água dos Vales, nos vales do Jequitinhonha e Mucuri.
Passalio defende que a PPP em questão e outras iniciativas semelhantes sejam leiloadas de forma paralela, porque não precisariam de uma aprovação prévia no Legislativo. O presidente da companhia argumenta que o investimento privado acelera a entrega de saneamento em relação à gestão exclusivamente pública.
“A PPP vai permitir que empresas privadas possam atuar fazendo os investimentos numa velocidade maior do que a Copasa faria, para que a gente chegue ao final do processo tendo o saneamento básico entregue. Saneamento básico é saúde, acima de tudo, é qualidade de vida”, ressaltou. “E por que isso vai andar independentemente da privatização? Porque a privatização ainda é uma incerteza, porque depende de uma atuação do governo com a Assembleia. O que nós temos de real hoje é uma gestão preocupada com o melhor serviço ao cidadão. Então, se a gente esperar a privatização, estaremos em cima de uma incerteza, deixando de cumprir um propósito desse governo”, concluiu.