Na Câmara, o que era para dar mais visibilidade a deputadas periga virar ‘gueto’
Poder do órgão como impulsionador da voz e da influência feminina no Congresso é questionado. Depois de onze anos da sua criação, a Secretaria de Mulheres tem dificuldades para se firmar como um espaço suprapartidário
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Siga noCriada em 2013, a Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados nasceu com o objetivo de ser “um centro de debate das questões relacionadas à igualdade de gênero e à defesa dos direitos das mulheres no Brasil e no mundo”. Na prática, o órgão que reúne a coordenação da bancada feminina, a Procuradoria da Mulher e o Observatório Nacional da Mulher na Política, deveria ser um espaço a partir do qual as mulheres ganhariam palco e voz para sensibilizar os homens e avançar com maior celeridade na ampliação do poder e da influência feminina no Parlamento.
No entanto, esse resultado é questionado atualmente. “A criação de estruturas dedicadas à mulheres servem para dar maior visibilidade ou criam um gueto”, questiona Cristiane Bernardes, técnica do (ONMP) Observatório Nacional da Mulher na Política da Câmara dos Deputados, pesquisadora sobre o tema e responsável pelo documentário “A Câmara”, que acompanhou o trabalho de várias parlamentares.
As críticas ao resultado mostrado por essa estrutura onze anos após a sua criação vêm justamente da dificuldade de articulação para ter uma atuação suprapartidária (na foto em destaque, parte da bancada feminina com o então presidente da Câmara, Arthur Lira, em 2023). Apesar de terem uma pauta comum para debater, as mulheres deputadas são diversas. Elas vieram de diferentes regiões, culturas, profissões, classes sociais e ideologias políticas. Com isso, elas não vão atuar sempre em bloco.
“Não se cobra isso dos homens, por que cobrar das mulheres?”, questiona Bernardes. “Muitas vezes, a bancada feminina enfrenta dificuldade de se posicionar porque o tema é controverso entre elas também”, completa Ana Paula Abritta, autora do estudo “Representatividade das mulheres na política”.
Ela lembra que pautas consideradas de maior relevância para os partidos não vão ser discutidas de forma consensual num espaço em que há 91 mulheres de legendas diferentes. Sem influência para extrapolar as paredes da secretaria, as pautas femininas, na maioria das vezes, ficam limitadas a esse espaço. Por isso, há quem defenda a criação de cotas em cargos chave na Câmara. “A criação de cotas impulsionaria mudanças regimentais e regulatórias para uma percepção de mudança mais acelerada”, diz Abritta.
Segundo a pesquisadora, nem todas as mulheres vão priorizar pauta de gênero ao ocupar cargos de maior influência política. Assim, faz-se necessário desenvolver políticas afirmativas mais incisivas e aplicar punição para o descumprimento das regras para que as mulheres consigam se projetar e romper o teto nesses espaços de concentração de poder e influência.