SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Empresas de planos de saúde pretendem levar à ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) uma proposta de alteração no rol de cobertura para o tratamento de pacientes com TEA (transtorno do espectro autista) e outros TGDs (transtornos globais do desenvolvimento), segundo a Abramge, associação que reúne mais de cem companhias do setor.
O setor se queixa das mudanças regulatórias adotadas nos últimos anos pela ANS, como a resolução que tornou obrigatória a cobertura de qualquer técnica ou método indicado pelo médico assistente e a liberação de consultas ilimitadas em terapias como fonoaudiologia e psicologia.
Para a FenaSaúde, as medidas não estipularam condições para o uso adequado do sistema e abriram brechas para a ocorrência de fraudes e abusos, além de gerar falta de profissionais capacitados para atender à demanda e aumento de custos.
A ANS diz que vem se reunindo com representantes das empresas e da sociedade para debater questões ligadas ao acesso e à sustentabilidade do setor diante das demandas dos beneficiários com TGD.
Em uma audiência pública realizada em outubro do ano passado com centenas de participantes, a FenaSaúde apresentou casos de pacientes com sobrecarga de horário, como uma prescrição para mais de 80 horas semanais de atendimento para um beneficiário de 8 anos de idade em múltiplos tratamentos com o mesmo fim terapêutico, além de solicitações de cobertura para técnicas sem evidência científica.
"Na ocasião, representantes da reguladora e de conselhos profissionais ressaltaram o aumento do número de atendimentos aos consumidores com TGD e a importância do acompanhamento integral e de qualidade a eles, o que reduz agravamento de problemas, e, por consequência, a elevação de custos com tratamentos e procedimentos de valor mais elevado", afirma a ANS, em nota.
Segundo Cassio Alves, antes de levar suas propostas, a Abramge vai aguardar uma manifestação da agência sobre a audiência. Na opinião dele, o país atravessa um momento de vazio regulatório.
"Há inúmeras terapias com horas em demasia, que não fazem bem para a criança. Vemos muitas distorções que, independentemente do desperdício, acabam prejudicando a segurança do paciente. Precisamos qualificar o acesso ao tratamento com evidência científica, com uma linha de cuidado, um protocolo. Se tivermos uma diretriz de uso racional qualificada, como se usa no mundo todo, cortam-se esses desperdícios", diz Alves.
A iniciativa preocupa representantes de pacientes e ocorre no momento em que também crescem as queixas sobre a assistência prestada pelos planos.
"Não consideramos adequada a chamada linha de cuidado. O autismo é um espectro, portanto, não é possível estabelecer um parâmetro único de cuidado quando consideramos que há variados graus de suporte e individualidades. As próprias operadoras já adotam esse entendimento de individualização ao negar ou conceder horas de atendimento terapêutico, por exemplo, no âmbito de ações judiciais. Padronização, nesse contexto, é uma forma irresponsável de corte de custos", afirma em nota a assessoria da deputada estadual Andrea Werner (PSB), que também preside a Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência na Assembleia Legislativa de São Paulo.
A deputada tem sido uma das principais porta-vozes de pacientes em tratamento que tiveram seus planos cancelados unilateralmente por operadoras no ano passado. Entre abril e maio, o gabinete dela recebeu cerca de 200 denúncias sobre rescisão unilateral, a maioria envolvendo crianças com autismo, câncer e epilepsia.
"É importante destacar que linhas de tratamento devem ser definidas em discussão com a sociedade e conselhos de profissionais de saúde, como Cremesp, Conselho Federal de Psicologia ou mesmo pela Anvisa, quando há necessidade de uso de medicamentos, e não unilateralmente, por empresas e uma agência que regula prestação de serviços", diz, em nota.