Pessoas idosas com a chamada síndrome da fragilidade devem ser priorizadas na atenção primária à saúde por serem mais suscetíveis a quedas, hospitalizações, incapacidade e morte precoce. A condição é caracterizada pela presença de três ou mais dos seguintes fatores: perda de peso involuntária, fadiga, fraqueza muscular, diminuição da velocidade de caminhada e baixa atividade física.

Estudo divulgado por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da University College London (Reino Unido) identificou que os fatores que aumentam o risco de fragilidade na velhice são diferentes entre homens e mulheres.

De acordo com resultados publicados na revista Archives of Gerontology and Geriatrics, há maior risco de desenvolver a síndrome da fragilidade em homens com osteoporose, baixo peso, doenças cardíacas e com percepção da audição avaliada como ruim. Já entre as mulheres, o risco está associado a alta concentração sanguínea de fibrinogênio (um marcador de doença cardiovascular), diabetes e acidente vascular cerebral (AVC).

As conclusões se baseiam na análise de dados de 1.747 pessoas idosas que integram o English Longitudinal Study of Ageing (Estudo Elsa), pesquisa populacional realizada no Reino Unido. Os indivíduos foram avaliados de quatro em quatro anos entre 2004 e 2016. Para este trabalho, os pesquisadores selecionaram pessoas com 60 anos ou mais e que inicialmente não tinham a síndrome da fragilidade e nem pré-fragilidade, ou seja, quando estão presentes um ou dois fatores mencionados anteriormente.



“A síndrome da fragilidade serve como um sinal amarelo para desfechos negativos em pessoas idosas. Chegou-se a acreditar que ela se dava por uma via única, mas nosso estudo reforça que diferentes percursos podem levar à fragilidade em pessoas idosas. Identificar diferenças nesse processo entre homens e mulheres é importante para a formulação de políticas públicas. Isso pode ter reflexos na atenção básica de saúde e resultar em planos de ação e intervenção em pessoas idosas mais focados no gênero”, explica Tiago da Silva Alexandre, professor do Departamento de Gerontologia da UFSCar e autor do estudo, que foi financiado pela FAPESP.

Alexandre explica que a síndrome da fragilidade tem um fenótipo (ou conjunto de sinais e sintomas facilmente identificáveis) criado para detectar previamente pessoas em maior risco de sofrer uma queda, hospitalizações, incapacidade e morte precoce.

“O que fizemos nesse estudo foi retornar alguns passos antes desse processo se iniciar e identificar quais características ao longo da vida dessas pessoas idosas podem acarretar a fragilidade. Isso porque sabemos que, quando se pensa em envelhecimento e qualidade de vida no envelhecimento, é muito importante saber os principais fatores de risco para se antecipar aos problemas, pois desse modo podemos direcionar as políticas públicas para homens e mulheres”, diz.

O trabalho é fruto da tese de doutorado de Dayane Capra de Oliveira, conduzida sob orientação de Alexandre. Oliveira explica que, embora a fragilidade seja uma ferramenta baseada nas questões biológicas do indivíduo, a diferença encontrada entre os fatores de risco que levam homens e mulheres a desenvolver a síndrome está ancorada nos distintos papéis sociais e acesso a recursos ao longo da vida.

“O interessante do estudo também está em perceber essas questões multifatoriais relacionadas à fragilidade. Enquanto os fatores socioeconômicos, distúrbios musculoesqueléticos, doenças cardíacas e baixo peso parecem sustentar o processo de fragilidade nos homens, nas mulheres o processo parece estar ancorado em distúrbios cardiovasculares e neuroendócrinos”, diz Oliveira.

Vale destacar que a síndrome da fragilidade é mais comum em mulheres do que em homens, até porque a expectativa de vida das mulheres é maior. “Essa é uma questão complexa, que está ancorada nas diferenças da expectativa de vida entre os dois gêneros e nos tipos de doenças mais prevalentes entre homens e mulheres. Basicamente, as mulheres são mais afetadas por doenças crônicas que não matam, mas geram incapacidade. Então, como uma consequência dessa realidade, elas vivem mais tempo e podem desenvolver mais a síndrome de fragilidade do que os homens”, explica Alexandre.

Diferenças e semelhanças

Os pesquisadores explicam que, apesar de homens e mulheres apresentarem alguns fatores de risco semelhantes para a fragilidade – como idade avançada, baixa escolaridade, sedentarismo e sintomas depressivos, por exemplo –, diferenças na composição corporal e localização de deposição de gordura entre os dois sexos ao longo da vida e na velhice podem desencadear aparecimento de componentes de fragilidade de forma direta ou indireta, mediando alterações metabólicas que culminam no surgimento de doenças que aumentam o risco de fragilidade.

“É claro que o nosso estudo é uma análise que leva em consideração a realidade de gênero de pessoas que hoje têm mais de 60 anos e vivem na Inglaterra. Não sabemos como isso se daria nas próximas gerações. Mas o fato é que, para as pessoas dessa geração que estudamos, os homens eram mais expostos a várias questões laborais consideradas fatores de risco para doenças. A alimentação deles era menos saudável, eles não consultavam médicos tanto quanto as mulheres [portanto, havia menos diagnóstico precoce] e tinham maior consumo de álcool e exposição a agentes nocivos, o que aumenta o risco de doenças cardiovasculares, como o infarto”, explica Alexandre.

Já as mulheres daquela mesma geração, afirma o pesquisador, são mais afetadas por doenças crônicas: que matam menos, mas incapacitam. “Portanto, essa realidade diferente entre os gêneros surge como um pano de fundo ao longo de toda uma vida e que culmina em um processo de envelhecimento e causas de morte, incapacidade e fragilidade diferentes entre homens e mulheres”, complementa.

De acordo com Simone de Paula Pessoa Lima, geriatra da Saúde no Lar, especializada em home care, mapear os diferentes fatores de risco para a fragilidade na velhice é de grande importância, pois isso permite uma abordagem mais personalizada e eficaz na prevenção e no tratamento dessas condições.
“Cada pessoa tem características muito individuais e todo seu histórico de vida e genético precisa ser analisado. Mas quanto maior o embasamento, mais direção e acerto com relação à sua melhoria de vida.”

Ela acredita que resultados podem guiar políticas públicas mais direcionadas, levando em consideração as necessidades específicas de cada gênero. Além disso, estratégias de intervenção mais apropriadas podem minimizar os riscos e melhorar a qualidade de vida na terceira idade.

“É fundamental que tanto eles quanto seus familiares estejam cientes desses riscos e busquem um estilo de vida saudável que inclua atividade física regular, nutrição adequada, uma boa noite de sono e acompanhamento médico de perto. A conscientização social sobre as necessidades específicas deste grupo também é um ponto crucial que deve ser incentivado, gerando apoio e o respeito às diferenças de gênero na velhice.”

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