Os cientistas debruçam-se há algum tempo sobre uma ameaça alarmante: o declínio da contagem de espermatozoides, que afeta homens no mundo inteiro. A ideia é identificar os verdadeiros inimigos. Embora as mudanças no estilo de vida sejam importantes, há ainda muitos casos de pessoas que, com bons hábitos, enfrentam essa diminuição da contagem de espermatozoides. Agora, um estudo publicado em novembro mostra que o declínio prolongado na fertilidade masculina sob a forma de concentrações de espermatozoides parece estar ligado ao uso de pesticidas. “A concentração de espermatozoides por mililitro de sêmen declinou de 101,2 milhões para 49 milhões no período de 1973 a 2018. Os investigadores compilaram, avaliaram e analisaram os resultados de 25 estudos sobre certos pesticidas e a fertilidade masculina e descobriram que os homens que foram expostos a certas classes de pesticidas tinham concentrações de espermatozoides significativamente mais baixas”, explica o especialista em reprodução humana e diretor clínico da clínica Mater Prime, em São Paulo, Rodrigo Rosa.
“São agrotóxicos utilizados no Brasil”, complementa Rodrigo. O estudo, publicado em novembro na Environmental Health Perspectives, incluiu dados de mais de 1,7 mil homens e abrangeu várias décadas, com uma sentença: os agrotóxicos pertencentes às classes carbamatos e organofosforados são prejudiciais à fertilidade masculina. Eles são inseticidas inibidores da acetilcolinesterase, de uso agrícola, doméstico e veterinário. Por exemplo, os agrotóxicos organofosforados, segundo o Sistema de Informações sobre Agrotóxicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) estão registrados 38 ingredientes ativos da classe dos organofosforados, entre eles, acefato, bromofós, clorpirifós, diazinona, diclorvós, etoprofós, fenclorfós, fentiona, malationa, metamidofós, parationa metílica, pirimifós e temefós.
A conclusão dos cientistas é contundente. “Não importa como olhamos para as análises e os resultados, vimos uma associação persistente entre o aumento dos níveis de inseticida e a diminuição da concentração de espermatozoides”. “É fundamental que esses dados sejam utilizados como forma de buscar alternativas para evitar o uso desses pesticidas. Esperamos que o estudo chame a atenção dos órgãos reguladores que procuram tomar decisões para manter o público protegido contra impactos inadvertidos e não planeados dos inseticidas”, diz Rodrigo.
O especialista explica que, durante décadas, os cientistas têm tentado desvendar questões intrigantes sobre a fertilidade masculina. “As concentrações de espermatozoides são um dos vários fatores que constituem um indicador útil. Um relatório do ano passado concluiu que a contagem de espermatozoides estava a diminuir em todas as regiões do globo e que o ritmo desse declínio estava a acelerar”, explica o médico. Os cientistas há muito suspeitam que as mudanças no ambiente poderiam estar a contribuir, e há décadas investigam o papel dos pesticidas em estudos com animais e em investigação epidemiológica humana.
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A maior parte das pesquisas, mas não todas, centrou-se nas exposições no local de trabalho. Os pesquisadores controlaram fatores externos que poderiam contribuir para diminuir a contagem de espermatozoides, como tabagismo e idade. “Os pesquisadores não têm certeza de como os pesticidas estão afetando as concentrações de espermatozoides e acreditam que serão necessárias mais pesquisas. É provável que os pesticidas sejam um dos muitos fatores ambientais que podem estar a contribuir para um declínio nas concentrações de esperma”, informa Rodrigo.
Existem muitos fatores de confusão que podem afetar a fertilidade masculina, incluindo idade, obesidade e uso de opioides, para citar alguns. “As concentrações de espermatozoides são um dado importante a considerar, mas outros fatores, como a forma como os espermatozoides são moldados e como nadam, também são críticos para a fertilidade masculina. Mas, dado o conjunto de evidências e estas descobertas consistentes, é hora de reduzir proativamente a exposição aos inseticidas para os homens que desejam ter famílias. De qualquer forma, qualquer casal que experimente uma dificuldade em engravidar no período de um ano deve procurar um especialista em reprodução humana”, indica o médico.