Por que uma doença inflamatória de pele pode aumentar o risco cardiovascular? Qual é, afinal, a relação da psoríase grave e a disfunção microvascular coronária, doença que afeta o coração? Um novo estudo publicado em outubro no Journal of Investigative Dermatology identifica um caminho para entender essa associação. “A psoríase é uma doença inflamatória sistêmica crônica imunomediada que afeta de 1% a 3% da população global. Neste estudo, 503 pacientes com psoríase e sem doença cardiovascular clínica foram submetidos à ecodopplercardiografia transtorácica para avaliar a microcirculação coronariana. Os investigadores descobriram uma alta prevalência de disfunção microvascular coronariana em mais de 30% dos pacientes assintomáticos na população do estudo”, explica a dermatologista membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, Ana Maria Pellegrini. A doença de pele não é contagiosa e se caracteriza pela presença de manchas róseas ou avermelhadas, recobertas por escamas esbranquiçadas (placas).
“Além do risco cardiovascular, a psoríase ainda é ligada a problema nas articulações (artrite psoriática) e, também, a uma maior propensão de desenvolver síndrome metabólica, caracterizada por pelo menos três dos seguintes problemas: maior acúmulo de gordura abdominal, pressão arterial elevada, colesterol alterado, glicemia de jejum elevada e triglicerídeo elevado”, acrescenta a médica.
Estudos anteriores já haviam demonstrado que pacientes com psoríase grave apresentam aumento da mortalidade cardiovascular. No entanto, os mecanismos específicos subjacentes a este risco aumentado ainda não haviam sido identificados. Por isso, os autores do estudo pretendiam investigar mais detalhadamente a prevalência de disfunção microvascular coronariana, avaliada pela reserva de fluxo coronariano (CFR), em uma grande coorte de pacientes com psoríase grave e sua associação com a gravidade e duração da psoríase, bem como outras características dos pacientes.
O estudo revelou que a gravidade da psoríase, avaliada pela pontuação do Psoriasis Area Severity Index (PASI), e a duração da doença, foram independentemente associadas a uma reserva de fluxo coronariano mais baixa, juntamente com a presença de artrite psoriática. “Esses achados enfatizam a importância de considerar fatores relacionados à inflamação e à psoríase na avaliação do risco cardiovascular em pacientes com psoríase grave”, explica a médica.
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O estudo apoia o papel da inflamação sistêmica da psoríase no desenvolvimento da disfunção microvascular coronariana. “Devemos diagnosticar e procurar ativamente a disfunção microvascular em pacientes com psoríase, uma vez que essa população apresenta um risco particularmente elevado. Poderíamos levantar a hipótese de que um tratamento precoce e eficaz da psoríase restauraria a disfunção e, eventualmente, preveniria o risco futuro de complicações, como infarto do miocárdio e insuficiência cardíaca associada. Alguns estudos preliminares mostraram que a disfunção microvascular coronariana é restaurada após um tratamento com produtos biológicos. No entanto, estudos prospectivos são necessários para confirmar se esses achados se traduzem em reduções em eventos cardiovasculares", diz Ana.