A rotina começa às 4h da manhã, quando um profissional de enfermagem entra para a primeira dose de medicação. Ao longo do dia, são pelo menos oito visitas das equipes de saúde para ministrar medicamentos. Uma vez ao dia, o médico vai ao quarto para avaliação das condições do paciente, conversar sobre os sintomas e orientar sobre procedimentos futuros. Esse tem sido o dia a dia do aposentado Rafael Antonio Garaffa, internado há mais de 80 dias no Hospital São Marcelino Champagnat, em Curitiba (PR).



Rafael foi internado no hospital devido a uma trombose no braço. Tratou da condição e se submeteu a uma nova cirurgia de gastroplastia, ou redução de estômago. Sua primeira operação ocorreu em 2011, em um hospital de Santa Catarina. Complicações subsequentes levaram a dificuldades para se alimentar, digerir e a episódios de hipoglicemia. Desde então, passou por mais quatro procedimentos cirúrgicos.

Internado desde o início de dezembro de 2023, Rafael não apenas segue os cuidados médicos, mas também estabeleceu práticas para reforçar sua fé. “De segunda a quinta-feira, às 3h da tarde, participo do terço da misericórdia, na capela do hospital. Na sexta, assisto à missa, e nos fins de semana, gosto de ir à capela para rezar. Além disso, como sou católico, recebo a comunhão no meu quarto, de segunda a sexta-feira. A equipe da Pastoral que trabalha aqui vem distribuir o corpo de Cristo para todos os que pedem”, relata o paciente.

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Para ele, o suporte espiritual é essencial para enfrentar o tratamento e os quase três meses de internação. “Ter fé nos dá coragem e força para enfrentar os desafios e adversidades da doença. Não é fácil ficar numa internação mais comprida, mas se a gente põe um sentido e se esse sentido é a fé, isso nos conforta, independentemente da religião ou crença”, reflete Rafael.

Medicina e espiritualidade

Estudos demonstram os benefícios da espiritualidade e da fé em momentos de dificuldade de saúde. O médico Ronnie Ykeda, coordenador da Comissão de Cuidados Paliativos no Hospital Universitário Cajuru, atende pacientes com condições crônicas ou graves. Ele acredita que a fé é um diferencial. “A doença grave, por sua característica de ameaça à vida, é capaz de despertar no indivíduo uma espécie de ‘meditação sobre a realidade’, relembrando para nossa consciência uma característica fundamental do viver: a sua fragilidade. Tal situação pode desencadear no ser humano uma reflexão profunda sobre aquelas perguntas fundamentais: ‘de onde viemos?, ’para aonde vamos?’, e ‘qual o propósito da minha vida?’. Essa capacidade de reflexão, ou espiritualidade, é crucial durante o adoecimento, oferecendo conforto e podendo até influenciar positivamente o tratamento”, explica.

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Por serem hospitais do Grupo Marista, o São Marcelino Champagnat e o Universitário Cajuru contam com atuação da Pastoral, trazendo a missão da Igreja à comunidade. Segundo a analista sênior do setor, Telma Rodrigues, o acolhimento é essencial para todos no ambiente hospitalar. “Paciente, familiares e profissionais de saúde buscam algo que possa nutrir sua espiritualidade e muitas vezes encontram na fé a solução para suas inquietações. Portanto, espaços dedicados à prática espiritual são muito importantes não só para o suporte emocional, mas também para proporcionar um momento de descanso mental, alívio do estresse e fortalecimento da fé.”

Nova capela

Em fevereiro, o Hospital São Marcelino Champagnat inaugurou uma nova capela, ao lado do Centro Cirúrgico. Este espaço, dedicado à oração e ao acolhimento, foi estrategicamente posicionado para que familiares e acompanhantes permaneçam próximos aos pacientes durante os procedimentos cirúrgicos.

A pintura da capela foi feita pelo monge beneditino Dom Roberval Monteiro, artista plástico especializado em arte sacra contemporânea. Natural do Paraná e atualmente residente na Itália, ele retornou ao Brasil especialmente para este projeto. “Concebemos a capela como um lugar de contemplação. Pensamos no projeto como uma Sarça Ardente, descrita no livro do Êxodo, onde Moisés, após fugir do Egito, se depara com um arbusto em chamas que, surpreendentemente, permanece verde. Ele se aproxima e ouve palavras que estão escondidas aqui na pintura. Então esse é um pouco do contexto de deserto, mas não só o deserto físico, mas o deserto espiritual, o deserto humano que a gente experimenta na doença. Você pode ser a pessoa mais rica do mundo, mas diante da doença você se encontra no deserto porque o dinheiro não compra a vida. Por isso, a pintura da capela representa Deus no sofrimento do seu povo. É como se Ele estivesse dizendo ‘eu sei o que você está passando e eu estou presente’”, detalha Dom Roberval.

Para o coordenador da Comissão de Cuidados Paliativos, os espaços para a prática da fé nos hospitais são uma demonstração de respeito às necessidades de pacientes e familiares. “É fundamental a existência desses locais com a função de tirar o enfoque puramente biológico que os hospitais e a medicina dão ao ser humano e introduzir um enfoque espiritual/religioso, ou seja, a oportunidade de conexão do indivíduo com o divino ou com aquilo que dá sentido à sua vida. Isso demonstra o compromisso da administração hospitalar com um atendimento integral, ressaltando o respeito pelo bem-estar dos pacientes e de seus familiares. Garantir o exercício da espiritualidade, mais precisamente, da religiosidade, pode aliviar ansiedade, depressão, dor e outros sintomas. Além disso, no cenário de fim de vida, a prática espiritual pode evitar medidas artificiais agressivas, que apenas prolongam o sofrimento sem qualidade de vida, auxiliando, portanto, na construção de um plano de cuidado individualizado para cada paciente”, pontua Ronnie.

Atualmente, o Hospital São Marcelino Champagnat conta com duas capelas: a recém- inaugurada, ao lado do Centro Cirúrgico, e a que fica no térreo, ao lado da recepção. No Hospital Universitário Cajuru, a capela está localizada no térreo, próximo aos leitos de internação de pacientes.

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