A diabetes é uma doença extremamente prevalente no Brasil, afetando cerca de 10% da população brasileira, segundo dados da pesquisa Vigitel 2023. E grande parte desse público é dependente do uso de injeções de insulina para controle da doença, o que representa um desafio no tratamento da diabetes. A deficiência na secreção ou ação da insulina - hormônio produzido no pâncreas que é responsável por controlar o nível de glicose no sangue - faz com que alguns pacientes diabéticos controlem os níveis de açúcar no sangue utilizando a insulina exógena, geralmente administrada por meio de injeções. O problema é que muitos pacientes são resistentes e se sentem desconfortáveis com o uso de injeções de insulina, o que dificulta a adesão ao tratamento.
"Além disso, esse método pode causar hipoglicemia, com queda importante dos níveis de glicose no sangue”, destaca Deborah Beranger, endocrinologista, com pós-graduação em Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (SCMRJ). Mas, agora, pesquisadores desenvolveram um método que permite que a insulina seja ingerida oralmente e tem menos efeitos colaterais. A descoberta foi publicada em janeiro na revista científica Nature.
Segundo Deborah, apesar de muitos medicamentos serem administrados por via oral, essa não era, até então, uma possibilidade com a insulina. “Isso porque a insulina é quebrada durante a passagem pelo estômago e intestino e, logo, não consegue chegar ao fígado, onde deve agir”, esclarece. Felizmente, os pesquisadores conseguiram driblar esse problema ao criar um revestimento que protege a insulina de ser decomposta pelos ácidos estomacais e enzimas digestivas, mantendo-a segura até alcançar o fígado, onde é finalmente quebrada por enzimas ativas somente quando os níveis de açúcar no sangue estão altos".
Ou seja, a insulina só é liberada quando os níveis de glicose estão altos, mas nada acontece se esses níveis estiverem baixos, pois as enzimas responsáveis por quebrar a insulina não estarão ativas. "Isso reduz o risco de hipoglicemia, pois a liberação de insulina ocorre de maneira controlada de acordo com as necessidades do paciente, ao contrário do que acontece com as injeções, em que a insulina é liberada de uma só vez”, diz a endocrinologista.
Além de ter menos efeitos colaterais, esse método de insulinoterapia também é mais preciso, pois entrega a insulina rapidamente no local necessário. Já com as injeções, a substância se espalha por todo o organismo e pode causar efeitos colaterais importantes. “O novo método entrega a insulina diretamente no fígado, onde pode ser absorvido ou entrar na circulação sanguínea para circular pelo organismo. Em contrapartida, com as injeções, uma grande parte de insulina acaba nos músculos e tecidos adiposos, o que pode levar ao acúmulo de gordura e à hipoglicemia”, afirma Deborah.
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O novo método foi testado em babuínos saudáveis, que apresentaram redução dos níveis de açúcar no sangue. Também foi testado em ratos e camundongos com diabetes, que não sofreram com hipoglicemia, acúmulo de gordura ou ganho de peso. E, para tornar a insulina oral mais palatável, os pesquisadores ainda a incorporaram em chocolate sem açúcar, o que foi bem recebido. O próximo passo é o teste em humanos, que deve começar em 2025. A expectativa dos pesquisadores é que o novo medicamento esteja amplamente disponível para uso em dois ou três anos.
“O uso oral de insulina pode representar uma verdadeira revolução no tratamento da diabetes e na qualidade de vida dos pacientes que sofrem com a condição, pois, além de ter menor efeitos colaterais, é mais prático, discreto e confortável ao paciente, não havendo necessidade de se espetar com uma agulha e nem de refrigeração”, destaca a especialista.