Vestido com seu característico terno de gola fechada, o pastor nigeriano Chris Oyakhilome olha diretamente para a câmera, declarando que "nunca houve uma prova de que as vacinas alguma vez funcionaram".
Tudo que nos contaram sobre a vacinação era "mentira", diz ele no sermão transmitido no canal de sua igreja no YouTube em fevereiro.
Conhecido como Pastor Chris, o sexagenário é um dos pregadores evangélicos mais conhecidos da África.
A BBC reviu dezenas dos seus sermões de 2023 e 2024 e descobriu que ele tem espalhado mensagens antivacinas aos seus seguidores, visando especificamente a nova vacina contra a malária, que está sendo distribuída nos países africanos.
A malária é um problema enorme em África. Cerca de 95% das mortes relacionadas à malária em 2022 ocorreram no continente, sendo as crianças menores de cinco anos as vítimas de 80% das mortes, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Nos últimos seis meses, a empresa do pastor Oyakhilome também produziu pelo menos cinco documentários antivacinas de 20 minutos, transmitidos em cultos religiosos ou partilhados na sua plataforma de streaming de vídeo, fugindo das políticas das empresas de redes sociais contra conteúdos antivacinas.
O anúncio, no ano passado, do lançamento de uma vacina contra a malária — após décadas de tentativas — foi saudado pelos especialistas como uma grande conquista que poderia salvar dezenas de milhares de vidas.
De acordo com a agência das Nações Unidas para a infância, a Unicef, campanhas de vacinação bem-sucedidas desde 2019 no Quênia, Gana e Malawi causaram uma queda de 13% nas mortes de crianças em idade elegível.
Mas os médicos temem que os sermões do influente pastor possam afetar negativamente a adesão às vacinas na África.
Em agosto do ano passado, ele alertou em um sermão sobre "uma agenda maligna que vem sendo elaborada há muito tempo".
Ele então espalhou uma teoria da conspiração popular na comunidade antivacinas – de que os imunizantes são uma forma de "despovoar o mundo".
O pastor também disse falsamente que "a malária nunca foi um problema para os africanos".
"A divulgação de informações falsas sobre vacinas, especialmente por parte de figuras influentes como líderes religiosos, pode contribuir para a perpetuação de mitos e conceitos errados, alimentando ainda mais a hesitação em se vacinar."
"Isto pode ter consequências devastadoras para a saúde pública, particularmente na região africana onde ocorrem frequentemente doenças evitáveis por vacinação", disse um porta-voz da OMS.
As observações do pastor Oyakhilome foram classificadas como uma das tendências de desinformação "a serem observadas" antes do lançamento da vacina contra a malária em um relatório divulgado em março pela Aliança Africana de Resposta à Infodemia, apoiada pela OMS.
Perguntamos ao pastor sobre suas declarações contra a vacinação através dos e-mails de sua empresa e de sua igreja. Não recebemos resposta.
Ampla influência
O pastor fundou na década de 1990 a igreja Christ Embassy na principal cidade da Nigéria, Lagos, e acumulou centenas de milhares de seguidores em todo o mundo.
Em 2011, ele foi destaque na revista Forbes como um dos pastores mais ricos da Nigéria, com um patrimônio líquido estimado entre US$ 30 milhões e US$ 50 milhões.
Segundo a revista, os diversos interesses comerciais do pastor incluíam jornais, revistas, uma estação de televisão local, uma gravadora, TV via satélite, hotéis e muitos imóveis.
Seu império, chamado LoveWorld Inc, cresceu desde então. Agora inclui um serviço de streaming, um aplicativo de mensagens com mais de um milhão de downloads na loja de aplicativos do Google e um banco de microfinanciamento.
Uma vez por semana, o pastor Oyakhilome prega no enorme acampamento da igreja em Asese, ao longo da via expressa Lagos-Ibadan.
Quando a BBC visitou a igreja em novembro passado, centenas de pastores de diferentes nacionalidades enchiam o auditório para uma conferência anual. Bandeiras de dezenas de países foram exibidas no interior.
Os seus "ensinamentos e serviços de cura online massivos" têm uma participação global de "7 bilhões de pessoas", de acordo com o website da Christ Embassy – o que é altamente improvável, dado que a população do planeta é estimada em oito bilhões.
Winnifred Ikhianosin, 25 anos, frequenta regularmente a igreja. Ela disse à BBC que se recusa a tomar vacinas.
"O homem de Deus nos contou", disse ela. "E eu também fiz minha pesquisa."
De acordo com Ada Umenwaliri, diretora associada do Centro de Estudos Africanos da Universidade da Carolina do Norte, com sede nos EUA, o pastor Oyakhilome tem um "poder firme sobre seus seguidores, que o admiram".
"Os pastores e líderes religiosos desempenharão sempre um papel significativo nas escolhas que os seus seguidores fazem."
A pobreza e a falta de infraestrutura de saúde na África permitem que as igrejas tenham um maior controle sobre as pessoas no que diz respeito à vacinação, disse ela.
Em artigo publicado no site de notícias nigeriano The Cable, no ano passado, o escritor Julius Ogunro, que frequentou a igreja do pastor por mais de uma década, disse: "Precisamos soar o alarme agora. É perigoso e não tem nada a ver com a fé cristã."
Um nome é repetido frequentemente pelo pastor Oyakhilome: Bill Gates. O bilionário é um dos maiores apoiadores da vacina contra a malária e tem sido alvo de teorias de conspiração sobre vacinação há anos.
Em um sermão em agosto de 2023, o pastor exibiu um trecho de uma palestra que Bill Gates deu em 2010 como um exemplo de uma das pessoas que tem "uma agenda para o despovoamento do mundo".
Ao discursar sobre a redução das emissões de dióxido de carbono, Gates disse: "Primeiro, temos a população. O mundo hoje tem 6,8 bilhões de pessoas. E está se encaminhando para nove bilhões. Agora, se fizermos um excelente trabalho em novas vacinas, cuidados de saúde, serviços de saúde reprodutiva, poderíamos reduzir isso em, talvez, 10 ou 15%."
Sua declaração foi tirada do contexto pelo pastor Oyakhilome: Gates não defendeu o despovoamento do mundo.
Ele esclareceu no passado que via o crescimento populacional e a melhoria da saúde como complementares: "Quando a saúde melhora, as famílias optam por ter menos filhos".
Oyakhilome também disse que as instalações do Programa Mundial contra Mosquitos na Colômbia pertenciam à Fundação Gates, acusando o programa de produzir mosquitos geneticamente modificados como estratégia de despovoamento.
A fábrica de mosquitos, criada para reduzir a capacidade dos insetos de transmitir vírus, pertence a um grupo de empresas sem fins lucrativos de propriedade da Universidade Monash, na Austrália.
O programa sublinhou que o seu método não envolve a utilização de organismos geneticamente modificados.
O pastor Oyakhilome conhece bem a desinformação antivacinas. Recentemente, ele também mirou a vacina contra o papilomavírus humano (HPV), destinada a proteger contra o câncer do colo do útero.
"Eles têm outra coisa na manga. Não se trata de câncer", disse ele durante um culto transmitido em 2 de setembro de 2023.
A Nigéria iniciou a campanha de vacinação em massa para jovens mulheres em outubro de 2023, em uma tentativa de reduzir drasticamente as taxas de câncer do colo do útero.
A doença mata mais de 8 mil mulheres na Nigéria todos os anos. Em 2021, um grande estudo financiado pelo centro de pesquisas Cancer Research UK descobriu que a vacina contra o HPV reduziu os casos de câncer do colo do útero em quase 90%.
No passado, o pastor Oyakhilome fez múltiplas alegações infundadas sobre vacinas antitetânicas, contra a poliomielite e outras imunizações infantis.
O pastor também afirmou falsamente que a vacina de RNA mensageiro altera o DNA.
A vacina não altera o DNA das pessoas. É necessária parte do material genético de um vírus – ou RNA mensageiro – para fazer com que o sistema imunológico aprenda a reconhecê-lo e a produzir anticorpos.
Durante a pandemia de covid, a igreja do pastor Oyakhilome recebeu uma multa de US$ 155 mil da agência britânica reguladora de mídia Ofcom.
A agência disse que sua rede Loveworld, transmitida no Reino Unido, exibiu "declarações enganosas e potencialmente prejudiciais sobre a pandemia do coronavírus e as vacinas".
Ogunro, o escritor que deixou a igreja, disse estar preocupado com a influência do pastor.
"Suas afirmações sobre a vacinação me assustam. Precisamos encontrar uma maneira de regulamentar pregadores como ele."
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