Uma noite de sono com qualidade é fundamental para a saúde por vários motivos. É durante o sono que o organismo passa por processos de reparação e regeneração, que englobam a síntese de células e tecidos novos, assim como a sedimentação de memórias e o processamento de informações. O sono também está diretamente ligado ao desempenho cognitivo, incluindo funções como atenção, concentração, tomada de decisões e resolução de problemas. Mas quando o descanso não é de qualidade, as consequências para o organismo são grandes: cansaço, irritação, ansiedade e maior suscetibilidade ao consumo de alimentos mais calóricos. Além do problema clássico da insônia, condições em órgãos como ouvido, pernas e estômago também podem dificultar o sono.

Zumbido

O que acontece: para a otoneurologista, otorrinolaringologista especialista em tontura e zumbido, Nathália Prudencio, as queixas sobre o sono são mais frequentes quando o zumbido é recente, momento em que o paciente está muito incomodado com o ruído e tem maior preocupação com as suas implicações. “Para piorar, muitos pacientes se queixam que o seu zumbido aumenta durante a noite. Em quase todos os casos isso é apenas uma percepção: o ruído não se intensifica, mas se destaca, pois há menos sons competindo com ele no ambiente. Quando o zumbido é um incômodo importante, ele, de fato, pode dificultar o sono, especialmente o adormecer. Além disso, o desgaste provocado pela insônia se soma à perturbação e à ansiedade causada pelo zumbido, podendo afetar significativamente a qualidade de vida do indivíduo”, explica a médica. “Existem estimativas que apontam que pessoas com zumbido no ouvido experimentam distúrbios do sono e sonolência diurna com maior frequência, e algumas pesquisas sugerem que isso pode ser explicado pelas alterações cerebrais observadas em pacientes com o sintoma. Entretanto, ainda são necessários mais estudos para confirmar essa relação”, complementa a médica.



O que fazer: segundo a otoneurologista, para atuar diretamente no zumbido, há a terapia sonora, que consiste em usar estímulos sonoros neutros — agradáveis ao paciente e mais baixos que o som do zumbido — para reduzir a percepção do sintoma em ambientes silenciosos. “Muitas pessoas fazem isso por conta própria, usando áudios da internet, por exemplo, mas o mais indicado é contar com a orientação e a supervisão de otorrinolaringologistas e fonoaudiólogos especializados para realizar o tratamento corretamente e receber orientações sobre medidas adicionais para se obter a melhora esperada”, recomenda.

Síndrome das pernas inquietas (SPI)

O que acontece: "Nessa condição, o paciente não consegue parar de mexer as pernas e acaba movendo involuntariamente. Normalmente esse movimento ocorre principalmente quando a pessoa está dormindo, atrapalhando a qualidade do sono. Ela fica agitada a noite inteira mexendo as pernas e não entra em sono profundo", afirma a cirurgiã vascular, membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular, Aline Lamaita. "Como afeta a boa qualidade do sono, o paciente tende a ficar cansado durante o dia. É uma patologia que obedece ao ciclo circadiano: as pernas do paciente ficam bem durante o dia e pioram durante a noite. A questão melhora quando está em movimento e piora quando a pessoa vai ficar parada, em repouso", acrescenta.

De acordo com a médica, de 5% a 10% da população experimenta o desconforto da síndrome alguma vez na vida, sendo que aproximadamente 30% dos casos de SPI têm causa hereditária. "Nos outros 70% dos casos, não existe causa conhecida. Quando a síndrome tem predisposição genética, frequentemente os sintomas são mais severos e mais difíceis de responder ao tratamento", conta Aline. "Este distúrbio é mais comum em indivíduos mais velhos, mas pode ocorrer em todas as idades e em homens e mulheres." Algumas situações, segundo a cirurgiã vascular, parecem estar relacionadas aos sintomas, como: deficiência de ferro, problemas vasculares nas pernas, neuropatias, distúrbios musculares, problemas renais, alcoolismo e deficiências de vitaminas e sais minerais.

O que fazer: "Na grande maioria dos casos, a queixa é tão característica que a história clinica já faz o diagnóstico, mas não é incomum que esses pacientes sejam andarilhos de consultas médicas como vasculares, ortopedistas, reumatologistas. A queixa muitas vezes é tachada como estresse, condição psicológica, entre outros", comenta. "Um primeiro passo no tratamento é determinar se condições relacionadas (como deficiência de ferro, diabetes, artrite, uso de antidepressivos) estão contribuindo para os sintomas e para os movimentos".

A médica enfatiza que o diagnóstico adequado e o tratamento destas condições podem aliviar os sintomas da síndrome. "Mas, ainda assim há pacientes que persistem com o distúrbio de movimento mesmo após o tratamento das condições relacionadas", explica. Aline ressalta que algumas atitudes, como banho quente, massagens nas pernas, aplicação de calor, bolsa de gelo, analgésicos, exercícios físicos regulares e eliminação da cafeína são medidas usadas para aliviar os sintomas. "Mas quando essas medidas não são suficientes, a SPI pode ser tratada com medicamentos que aumentam dopamina no cérebro, drogas que mexem nos canais de cálcio, opioides (que podem causar vício se usados em grandes quantidades) e benzodiazepinas (categoria que engloba alguns relaxantes musculares e remédios para dormir). "Ao longo dos anos, a SPI pode surgir e desaparecer sem uma causa óbvia", destaca a médica cirurgiã vascular.

Má alimentação

O que acontece: o horário que você come pode bagunçar seu relógio biológico – e piorar o sono. Sintomas instantâneos, como dificuldade para dormir, exaustão e problemas estomacais podem surgir, segundo a médica nutróloga e diretora da Associação Brasileira de Nutrologia, Marcella Garcez. Conforme a endocrinologista, com pós-graduação em endocrinologia e metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (SCMRJ), Deborah Beranger, o fígado, por exemplo, é extremamente afinado para determinar quando acelerar o metabolismo com base em quando você come. “Então, fica fácil entender que se você fizer isso no meio da noite, o fígado estará recebendo sinais contraditórios do cérebro, que está dizendo para descansar. Como resultado, quando o fígado começa a processar a comida da meia-noite, ele o fará com menos eficiência do que teria feito após uma refeição diurna – e envia sinais conflitantes de volta ao cérebro e a outros sistemas orgânicos. Isso também prejudica o sono”, diz Deborah Beranger.

“Tanto a refeição como o lanche podem causar problemas digestivos se tiverem quantidades exageradas de proteínas associadas a grandes quantidades de gorduras saturadas e carboidratos de alto índice glicêmico. As consequências imediatas são sintomas digestivos como refluxo gastroesofágico, azia, dor epigástrica, desconforto abdominal, que podem prejudicar a qualidade do sono e também ocasionar alterações na liberação de neurotransmissores e hormônios ligados ao ritmo circadiano”, afirma Marcella.

O que fazer: segundo a médica nutróloga, para evitar ou minimizar os desconfortos, o ideal é realizar a última refeição pelo menos duas horas antes de deitar para dormir. “Substâncias estimulantes como a cafeína e outras podem interferir no sono, pois aumentam o estado de alerta, por isso devem ser evitadas. Alimentos que contêm substâncias que promovem relaxamento podem contribuir para uma melhor qualidade do sono, como os alimentos ricos em triptofano, magnésio e vitaminas do complexo B”, explica Marcella.

“Evitar também refeições muito pesadas pouco antes de dormir e a desidratação, que também pode levar a desconforto durante a noite, enquanto a ingestão excessiva de líquidos antes de dormir pode causar interrupções frequentes para ir ao banheiro”, completa a nutróloga. Entre algumas sugestões da médica estão os alimentos ricos no aminoácido triptofano, que é precursor da serotonina e da melatonina, hormônio que regula o sono, presente em alimentos como peru, frango, leite, iogurte, banana e nozes.

“Alguns alimentos como cerejas, tomates, uvas e morangos contêm naturalmente a melatonina e podem ajudar a regular os ciclos do sono. Os carboidratos integrais, como aveia, arroz integral, quinoa, vegetais verdes, alimentos ricos em ômega-3, como peixes de águas frias, sementes e nozes, sem esquecer dos alimentos ricos em vitaminas do complexo B, especialmente B6 como carne magra, batata, banana e abacate, todos podem ter benefícios para a qualidade do sono”, diz a médica. “Os chás de ervas claras, que não contém substâncias estimulantes, como camomila, erva-doce, cidreira, hortelã e valeriana, podem ter propriedades relaxantes e ajudar a promover o sono”, ensina Marcella.

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