Muitos pacientes que enfrentam mudanças no ciclo circadiano não conseguem seguir um plano alimentar, têm maior carga de estresse e impulsos alimentares -  (crédito: Freepik)

Muitos pacientes que enfrentam mudanças no ciclo circadiano não conseguem seguir um plano alimentar, têm maior carga de estresse e impulsos alimentares

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O ciclo circadiano pode ter influência em mudanças no peso. “Esse ciclo é mediado por uma área no hipotálamo do cérebro chamada núcleo supraquiasmático, que coordena a liberação de hormônios que, à noite, diminuem a temperatura corporal e a pressão arterial e nos fazem sentir sono. Pela manhã, o cortisol e outros hormônios restauram nosso estado de alerta, nos aquecem e aumentam a pressão arterial”, destaca a  endocrinologista, com pós-graduação em endocrinologia e metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (SCMRJ), Deborah Beranger. Mas o ciclo circadiano não pode ser reduzido aos horários de dormir e acordar. “Uma dessincronização desse tique-taque interno pode gerar problemas de diversas formas no organismo. E a alimentação pode ser afetada por desequilíbrio no sono”, explica.

 

A médica explica que a quebra do padrão do sono desregula os níveis de saciedade, favorecendo o ganho de peso, além de induzir a variação hormonal. “O termo cronodisrupção é muito importante e é uma alteração do padrão normal do nosso ciclo cicardiano. Isso leva a várias alterações fisiológicas e metabólicas e está relacionado a vários distúrbios e doenças. Quando há uma grave perturbação da ordem temporal bioquímica, fisiológica e dos ritmos circadianos comportamentais, isso mexe também com a expressão de alguns genes que regulam nossas vias metabólicas e nossos hormônios. Muitos pacientes que enfrentam mudanças nesse ciclo não conseguem seguir um plano alimentar, têm maior carga de estresse e impulsos alimentares”, diz a médica nutróloga e diretora da Associação Brasileira de Nutrologia, Marcella Garcez.

 

 

Segundo Marcella, essa influência ocorre pelo relógio central do cérebro, que é controlado pela passagem do dia para a noite e é responsável por nos manter acordados durante o dia e dormir bem à noite, e pelo relógio periférico do corpo, responsável por regular a produção de enzimas que auxiliam na digestão e, logo, regulado pela alimentação. “O ideal é que ambos os relógios estejam sincronizados, já que o nosso organismo realiza um regime cuidadoso de processos metabólicos para se manter em equilíbrio”, diz a nutróloga. “Pacientes que dormem menos têm maior chance de desenvolver obesidade e diabetes, porque há um estresse maior no organismo, com aumento dos níveis do hormônio grelina, que aumenta a fome. Essas mudanças no ciclo circadiano estão associadas à expressão e à produção de hormônios como cortisol, leptina e adiponectina, relacionados à obesidade e que demonstram ritmicidade circadiana”, afirma Deborah Beranger.

Por isso, além de regular o sono, é importante tentar regularizar o horário das refeições. Marcella reforça que o café da manhã é o momento em que o organismo mais precisa da ingestão de nutrientes para se manter bem ao longo do dia, então também deve conter, além de proteínas, uma maior quantidade de carboidratos e fibras. “Já à noite, o organismo está se preparando para repousar. Então, o jantar deve ser mais leve, com sopas, lanches, saladas e proteínas magras, duas horas antes de dormir, já que a capacidade de digestão é menor após o pôr do sol”, complementa a médica.

 

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É importante ainda atentar-se a outros hábitos que podem bagunçar o ciclo circadiano, como os horários de exposição à luz, inclusive a artificial. “Obter luz consistente ao acordar e acordar no mesmo horário todos os dias pode ajudar a manter o relógio no caminho certo para que, por sua vez, você adormeça na hora ideal. Isso resulta em menos contraste entre sua fase ativa e sua fase de descanso, o que, no caso do sono, pode se traduzir em sentir-se mais cansado durante o dia e acordar com mais frequência à noite. Alguns estudos mostram que, mesmo enquanto você está dormindo, a luz fraca pode penetrar nas pálpebras fechadas e confundir o relógio interno”, detalha Deborah Beranger.

 

Níveis de estresse diários, os horários de trabalho não tradicionais (à noite, por turnos), a vida de festanças, o uso excessivo dos smartphones antes de dormir, o sedentarismo, a falta de exposição à luz solar e muitas outras questões comportamentais e mentais, como o crescimento dos casos de ansiedade e depressão, também estão bagunçando a ampulheta interna. Mas, apesar de ser difícil melhorar a qualidade do sono e mudar hábitos para controlar o estresse, vale a pena resistir.

 

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“Busque realizar uma atividade física que você goste. Quando seu corpo gasta energia, fica mais fácil regular o sono e diminuir o estresse. Além disso, tente uma alimentação mais saudável, evite gorduras excessivas, principalmente à noite. Quanto ao estresse do trabalho, o ideal é tentar relaxar quando chega em casa lendo um livro, fazendo meditação ou até terapia. Os descansos de fim de semana com atividades prazerosas também são bem-vindos. Desconectar do mundo online pode ser um caminho para melhorar a qualidade de vida e do sono. Bons hábitos vão ajudar a sincronizar melhor seus relógios internos e a chance de tudo entrar nos eixos é grande”, recomenda a endocrinologista.