PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) - Uma pesquisa identificou cerca de 1 milhão de substâncias que podem ser úteis no combate a infecções bacterianas. A descoberta é preliminar, mas importante quando se considera os casos desses microrganismos que são resistentes a medicamentos já existentes.

 



"Nós temos antibióticos e são muito importantes [...], mas as bactérias estão cada vez mais resistentes", resume Luis Pedro Coelho, biólogo computacional, professor associado da Universidade de Tecnologia Queensland, na Austrália, e um dos autores do estudo, que foi publicado nesta quarta-feira (5) na revista científica Cell.

Uma pesquisa divulgada recentemente calculou que, a cada ano, 750 mil mortes associadas a bactérias super resistentes poderiam ser evitadas por meio de diferentes ações, como ampliação no acesso a vacinas.

No caso do artigo assinado por Coelho, a ideia foi identificar substâncias naturais que podem ser adotadas no combate a esses microrganismos. Para tal, os pesquisadores utilizaram dados já consolidados de outros estudos que, por diversos motivos, investigaram uma variedade de bactérias.

 

A pesquisa enfatizou os peptídeos, unidades menores que formam as proteínas. Comumente, bactérias produzem essas substâncias para combater outros tipos de bactérias. Por isso, investigar os peptídeos pode ser uma chave para descobrir novas fronteiras no desenvolvimento de antibióticos mais precisos.

 

Como forma de investigação, os pesquisadores treinaram uma inteligência artificial (IA) com base em sequências genéticas já disponíveis pela literatura científica e com peptídeos que podem combater o desenvolvimento de bactérias.

 

Então, essa mesma inteligência foi utilizada para analisar outras sequências de peptídeos e, igualmente, seus efeitos para diferentes tipos de bactérias. Como resultado, quase 1 milhão deles foram identificados, sendo considerados como substâncias que podem vir a ser utilizadas no desenvolvimento de novos antibióticos.

 

Depois, os cientistas selecionaram cem sequências de peptídeos e observaram, na prática, sua ação contra bactérias, inicialmente in vitro (isto é, em células em laboratório) e depois em modelos com camundongos. Desse universo de cem peptídeos, 79 apresentaram ação antibacteriana contra pelo menos um microrganismo ?seja bactérias benéficas ao organismo humano ou as causadoras de doenças.

 

Dos 79, 63 apresentaram efeitos positivos no combate a bactérias patogênicas que já são reconhecidas por serem resistentes a antibióticos atuais. As substâncias conseguiram agir contra o desenvolvimento de pelo menos um entre 11 patógenos selecionados. Segundo Coelho, esses microrganismos investigados no estudo são considerados de grande risco para a saúde humana, como o caso das bactérias Staphylococcus aureus e Escherichia coli.

 

Mas ainda restam questões relacionadas às descobertas do estudo. Por exemplo, os pesquisadores observaram que algumas proteínas tinham efeitos diferentes mesmo entre bactérias com tipologias parecidas, uma questão ainda em aberto que pode ser investigada no futuro.

 

Além disso, o estudo conseguiu testar somente cem desses peptídeos, o que representa um desafio, já que a base compilada pela pesquisa é de cerca de 1 milhão. Coelho explica que é possível realizar testes semelhantes nos outros peptídeos, mas isso demanda um investimento alto em saúde e pesquisa. Uma possibilidade é avaliar os peptídeos com várias bactérias ao mesmo tempo, o que aceleraria o processo.

 

O autor também aponta que outro caminho é aprimorar a inteligência artificial utilizada no estudo. Nesse caso, o ideal é desenvolver um modelo hábil em predizer a molécula que afeta especificamente a bactéria que se deseja combater. Isso diminui os efeitos colaterais nos pacientes e também reduz a chance de desenvolvimento de bactérias resistentes.

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