O Supremo Tribunal Federal (STF) não legalizou a maconha, como afirmam publicações, que acumulam centenas de interações nas redes sociais, desde 20 de junho de 2024. Na verdade, a Corte formou maioria e decidiu que o porte da droga para uso pessoal não é crime e deve ser caracterizado como infração administrativa, sem consequências penais, com sanções previstas na legislação, enquanto a venda de entorpecentes segue sendo ilegal.
"Tá legalizada" e "STF decidiu que a maconha está liberada para consumo "são as frases sobrepostas a um vídeo que circula no Instagram e no Facebook.
A alegação é compartilhada junto à captura de tela de uma reportagem da GloboNews ou de um trecho da própria matéria. Na parte inferior da tela, lê-se a indicação da data"20 JUN" junto às informações "PORTE DE MACONHA: TOFFOLI VOTA PARA MANTER SANÇÕES" e "DESCRIMINALIZAÇÃO DE MACONHA: STF AINDA SEM MAIORIA".
A alegação começou a ser compartilhada após o STF retomar, em 20 de junho, o julgamento do Recurso Extraordinário (RE 635659) e formar maioria, em 25 de junho, pela descriminalização da maconha.
Mas, ao contrário do que afirmam as publicações, isso não significa que a droga esteja legalizada.
Julgamento
Uma pesquisa pela frase"Porte de maconha: Toffoli vota para manter sanções"e"GloboNews"exibiu a reportagem publicada no perfil oficial da emissora no Facebook em 20 de junho, e cujo trecho viralizou nas redes sociais. O vídeo também foi publicado no perfil da GloboNews no X nessa mesma data.
No vídeo, a repórter Isabela Camargo informa sobre o andamento do julgamento no STF."O julgamento que será retomado na próxima semana e que há, ainda, muitos pontos a serem considerados e analisados pelos ministros(...)Hoje, de fato, tivemos uma terceira opção de análise, que foi o impedimento do ministro Dias Toffoli", diz a jornalista.
Nessa data, o STF estava julgando a descriminalização do porte para consumo para uso pessoal e as quantidades que diferenciam usuários e traficantes.
O recurso, encaminhado ao STF em 2011, começou a ser julgado em 2015 e foi interrompido diversas vezes por pedidos de vista (mais tempo de análise) pelos magistrados.
Até20 de junho havia cinco votos favoráveis à descriminalização apenas no caso do porte de maconha para consumo pessoal: Gilmar Mendes (relator da ação), Luís Roberto Barroso (atual presidente do STF), Rosa Weber (atualmente aposentada), Edson Fachin e Alexandre de Moraes.
Sob argumentos diferentes, os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça e Kassio Nunes Marques já haviam votado contra.
Controvérsia
Na retomada do julgamento em 25 de junho, o ministro Dias Toffoli complementou o seu voto, iniciado na sessão anterior, quando argumentou que a Lei de Drogas já presume que o ato de portar entorpecentes não é crime, e afirmou que defende a descriminalização de todas as drogas.
Com esse voto, o STF formou maioria para que deixe de ser crime no Brasil o porte de maconha para uso pessoal.
Na sequência, a ministra Cármen Lúcia se manifestou pela descriminalização. Já na interpretação de Luiz Fux, a Lei Antidrogas é constitucional e deve ser mantida. O magistrado também ponderou que a definição entre usuário ou traficante não deveria ser feita pelo Poder Judiciário.
Em 26 de junho, a Corte estabeleceu o limite de 40 gramas ou seis plantas fêmeas de cannabis para diferenciar usuários de traficantes.
Descriminalização não é legalização
Não é correto afirmar que o STF "liberou" ou legalizou o consumo de entorpecentes.
"O que o STF fez agora não foi despenalizar e nem foi legalizar, ele descriminalizou", explica o advogado criminalista Rafael Paiva, mestre em Direito e professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha.
Descriminalizar é diferente de legalizar, como detalhou Paiva:"O que é descriminalizar? A conduta continua existindo, só que não é mais considerada crime, é considerado um ilícito administrativo."
Nesse sentido, o advogado destaca que desde 2006, com a aprovação da Lei de Drogas,"já houve a despenalização através de lei do Congresso Nacional. Ou seja, deixou de ter uma pena privativa de liberdade". E continuou:"A diferença é que hoje, com a descriminalização, não pode ser registrado boletim de ocorrência com relação ao porte de maconha para consumo pessoal".
Paiva detalha que ainda pode haver a apreensão da droga e"o destino de queimar, de incinerar, como já é feito atualmente. A diferença é que isso não vai gerar nenhum tipo de responsabilidade criminal por parte desse usuário, mas todas as outras medidas acontecem. Inclusive, ele vai poder ser punido com multa".
Como o recurso teve repercussão geral reconhecida — instrumento jurídico utilizado para uniformizar a interpretação sobre determinado tema —, todas as instâncias da Justiça deverão seguir a solução adotada pelo STF quando forem julgar casos semelhantes.
Mas isso não significa que o Supremo "legalizou" a maconha, já que a elaboração de novas leis é tarefa do Congresso Nacional.
Judiciário x Legislativo
Em abril de 2024, o Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2023, chamada de PEC das Drogas, que determina que é crime possuir ou portar qualquer quantidade de droga, mesmo que para consumo próprio. O texto é de autoria do presidente da Casa,Rodrigo Pacheco(PSD-MG), e ainda será analisado na Câmara dos Deputados.
Sua aprovação reverteria a decisão do STF a respeito da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal.
O presidente da Câmara dos Deputados,Arthur Lira(PP-AL),anunciou a criação de uma comissão especial para debater a PEC das Drogas.
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Referências
Tramitação do Recurso Extraordinário (RE 635659)
Reportagem da GloboNews no
e no
X
Notícias no site do STF (
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Lei de Drogas