Debate na CNN foi o primeiro entre Biden e Trump das eleições 2024 nos EUA -  (crédito: REUTERS/Brian Snyder)

Nossas funcionalidades e habilidades diminuem conforme envelhecemos

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O envelhecimento é um fenômeno relativamente recente na história da humanidade: se hoje em dia é comum vivermos além dos 80 anos, essa era uma realidade distante até há pouco tempo: em 1900, por exemplo, vivíamos, em média, 32 anos. E, durante cerca de 200 mil anos, a média de vida das pessoas esteve abaixo de 30 anos. Esse salto, que nos permitiu existir por muito mais tempo, também impõe desafios para a medicina: como lidar com o declínio da nossa agilidade de raciocínio e conexão com as palavras com o avanço da idade?

 

O tema entrou nas manchetes de imprensa e, em rodas de conversa em todo o mundo, após o debate entre o atual presidente norte-americano Joe Biden, de 81 anos, candidato à reeleição pelo partido Democrata, e o ex-presidente Donald Trump, de 78 anos, representante do partido Republicano.


O aparente declínio cognitivo de Biden em meio ao primeiro embate na televisão com seu concorrente na corrida presidencial, gerou preocupação entre os eleitores e suscitou dúvidas sobre suas reais capacidades físicas e mentais como maior barreira para uma possível continuidade no governo federal dos EUA. Mas afinal, quando de fato situações como a enfrentada pelo presidente norte-americano podem ser indício de um declínio cognitivo, demência ou Alzheimer?

 

 

A ciência ainda busca respostas e soluções mais objetivas em relação à prevenção e cura dessas condições, mas já é consenso entre os especialistas: a atenção aos sinais  para o diagnóstico precoce e as mudanças no estilo de vida são fundamentais para evitar e/ou retardar o avanço da chamada perda de memória, melhorando a qualidade de vida em todas as fases da vida. “Realizar um check up global, que inclua um rastreio para avaliar as funções cognitivas é a melhor forma de antecipar cenários”, diz a endocrinologista, Alessandra Rascovski, diretora médica da ATMA Soma e idealizadora da iniciativa 'Cérebro em Ação'.

 

“Em geral, as pessoas buscam esse rastreamento somente quando já percebem algum problema que atrapalhe a sua vida. Pode ser, por exemplo, um esquecimento muito frequente, uma dificuldade de planejamento. E aí, vamos avaliar como está a saúde do cérebro naquele momento”, explica. 

 

E, segundo a especialista, nem sempre essa conclusão é necessariamente o diagnóstico de uma doença. “A gente, naturalmente, vai diminuindo nossas funcionalidades e habilidades conforme envelhece, o que não significa que se tornará um diagnóstico de demência ou de outra enfermidade. E, sabendo em quais circunstâncias estamos, podemos agir para mudar: desde quimicamente, com medicamentos, e também no estilo de vida, modificando hábitos”, comenta.

 

Cérebro jovem 

 

O que faz com que essas mudanças sejam possíveis é a neuroplasticidade, um fenômeno natural do cérebro, que tem o poder de se modificar a partir de diferentes tarefas e novos desafios, como explica a fonoaudióloga Ana Alvarez. “Não há uma idade determinada para se fazer um rastreio neurocognitivo, porque as habilidades sempre podem ser ampliadas, melhoradas”, comenta.

 

De uma forma geral, o rastreio cognitivo inclui análise multissensorial, da memória espacial, acuidade auditiva, atenção, velocidade, planejamento, inibição, memória e flexibilidade. “Fazemos isso por meio de um protocolo de procedimentos desenvolvido por nós em que usamos métodos de avaliação tradicionais somados a uma triagem multissensorial, de função auditiva central e realidade aumentada imersiva para chegar a uma conclusão”, explica.

 

Alessandra Rascovski enumera 7 fatores que aumentam as chances de desenvolvimento do Alzheimer, conheça cada uma: 

 

1. Hipertensão

 

Manter a pressão arterial controlada é fundamental e é considerado um dos mais importantes fatores para prevenir a doença, mas não só ela: diversas complicações cardíacas podem ser evitadas, além de casos de acidente vascular cerebral (AVC). “O ideal é sempre ter uma pressão arterial de até 13 por 9”, explica Alessandra. Quem já tem a doença, que também tem causas genéticas, deve usar medicação diária para controlar os índices.

 

2. Estilo de vida

 

Controlar o peso e manter um estilo de vida saudável, com a prática de exercícios físicos, sono adequado, controle do estresse, não fumar e consumir bebida de forma moderada, são fundamentais. Visto que a obesidade, o tabagismo, o alcoolismo e o sedentarismo também são causas importantes nas chances de desenvolver a doença. “A gente vê que são fatores ligados à saúde como um todo e faz sentido: o cérebro não está alheio à saúde do resto do corpo”, comenta a endocrinologista.

 

3. Isolamento social

 

Depressão e isolamento social são outras das possíveis causas para aumento nas chances de desenvolver a doença. “A gente sabe que a pandemia fez com que esses índices aumentassem muito por conta das medidas sanitárias. Mas é importante que as pessoas retomem seus contatos sociais, mesmo que aos poucos, e busquem acompanhamento psicológico e ajuda, caso tenha dificuldade. Somos seres sociais e precisamos estar em contato contínuo com outros para vivermos bem”, afirma.

 

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4. Contexto socioeconômico e poluição

 

O nível de escolaridade é considerado o principal fator para a doença no Brasil. O estímulo ao cérebro e o aprendizado até principalmente os 12 anos de idade são ferramentas fundamentais para a saúde do órgão. Outro fator de contexto social é a poluição do ar, também apontada como de risco para o Alzheimer. “Países em desenvolvimento, como o Brasil, tem uma população mais vulnerável a esses fatores. A falta de equidade no acesso aos serviços com certeza atrapalha a saúde da população e é um fator que precisa de atenção dos governos”, ressalta.

 

5. Diabetes

 

Doença multifatorial das mais incidentes em todo o mundo, o diabetes também influencia o cérebro, inclusive nas chances de desenvolvimento do Alzheimer. Segundo a especialista, “aqui entra a fórmula de controle de peso, atividade física, alimentação saudável, sono e gerenciamento do estresse. Para quem já foi diagnosticado, o uso correto e controlado da medicação contribui para um melhor manejo da doença”. 

 

6. Perda auditiva

 

Nesse caso, além de sempre ir ao otorrinolaringologista para manter a saúde auditiva em dia, vale lembrar que no Brasil, existem mais de 15 milhões de pessoas com algum grau de deficiência auditiva, isso equivale a pouco mais de 7% da população total do país. Pessoas com alguma perda mesmo que leve, sem uso de aparelhos corretivos ou reabilitação, tem risco >42% de desenvolver demência.

 

7. Trauma

 

A publicação da Lancet Commission também incluiu traumatismo craniano como fator que influencia para o desenvolvimento de Alzheimer. “O trauma normalmente acontece por conta de acidentes, por isso a proteção com capacetes e atenção nos esportes com vulnerabilidade a lesões na cabeça, é essencial”, pontua Alessandra.

* Estagiária sob supervisão da editora Ellen Cristie.