Principal causa da perda de visão entre adultos mais velhos, a degeneração macular relacionada à idade (DMRI) poderá ser tratada, no futuro, com terapia gênica. Um estudo da Cirrus Therapeutics, da Universidade de Bristol e do Instituto Universitário Global de Oftalmologia de Londres, no Reino Unido, revelou que uma proteína específica produzida nas células da retina pode ser uma terapia nova e altamente eficaz para a condição. O artigo foi capa da revista Science Translational Medicine.
Com mais de 2 milhões de casos por ano no Brasil, a degeneração macular afeta gravemente a visão e pode levar à cegueira. Os pacientes começam geralmente a enxergar as imagens turvas ou com um ponto preto na visão central. Esse quadro pode se expandir até a perda total do sentido. Atualmente, a DMRI afesta aproximadamente 200 milhões de pessoas no mundo, um número que deverá aumentar para 288 milhões até 2040 com o envelhecimento da população.
A causa exata da DMRI é complexa e acredita-se que envolva uma combinação de fatores de envelhecimento, ambientais e de estilo de vida. Na pesquisa britânica, a equipe descobriu que o aumento dos níveis de uma proteína chamada IRAK-M nas células da retina tem potencial de proteger significativamente contra a degeneração da camada que reveste o interior dos olhos.
"Essa descoberta representa uma opção de tratamento abrangente para milhões de pessoas que sofrem de uma condição debilitante", diz Andrew Dick, chefe da Unidade Acadêmica de Oftalmologia da Universidade de Bristol, diretor do Instituto de Oftalmologia da UCL e cofundador e conselheiro científico chefe da Cirrus Therapeutics.
Biomarcador
Segundo Jian Liu, primeiro autor do estudo e pesquisador da Universidade de Bristol, como a idade é um fator de risco primário para DMRI, a diminuição gradual dos níveis da proteína à medida que se envelhece pode ser um biomarcador da condição. "Seria uma forma de identificar a progressão precoce. E, em última análise, oferecer uma nova forma de tratamento", acredita.
A descoberta foi feita quando os cientistas estudavam dados genéticos de um grupo de pacientes com degeneração macular relacionada à idade. Eles notaram que pessoas com certas mutações no gene IRAK3, que codifica a proteína IRAK-M, apresentavam um risco maior de DMRI com o envelhecimento. A equipe, então, examinou amostras do epitélio pigmentar da retina — uma camada nutritiva de células — de olhos humanos saudáveis. Os níveis de IRAK-M diminuíram com a idade e a exposição ao estresse oxidativo. A queda foi mais significativa nos olhos afetados pela DMRI.
Pigmento
Estudos em ratos também mostraram que a falta de IRAK-M interrompeu a manutenção das células do epitélio pigmentar da retina e levou ao envelhecimento celular acelerado. No entanto, os cientistas descobriram que poderiam usar a terapia gênica para repor os níveis da proteína em camundongos. O resultado foi comemorado: com a tecnologia, a degeneração foi retardada. Agora, os autores aguardam autorização para realizar estudos em animais maiores, para avaliar a segurança e eficácia.
"Essa descoberta nos levará a desenvolver novas terapias e melhorar os tratamentos atuais para a DMRI", acredita Ying Kai Cha, cofundador da Cirrus Therapeutics. "Nosso estudo aborda não apenas os múltiplos caminhos envolvidos no tratamento da DMRI, mas também oferece a estratégia mais convincente e baseada em evidências disponível atualmente."
Especialista em retina, o oftalmologista Ramon Barreto, do Visão Hospital de Olhos, explica que a terapia gênica já é uma realidade na oftalmologia. O médico recomenda o tratamento com a técnica para algumas distrofias retinianas, como a amaurose congênita de Leber, doença que leva à cegueira nos primeiros anos de vida. "Várias pesquisas para outras doenças oculares estão sendo realizadas e os resultados têm sido promissores", revela. "Mas, para essas outras doenças, a aplicação clínica ainda não se dará, provavelmente, no curto prazo. A longo prazo, porém, teremos, provavelmente, o uso bem-sucedido da terapia genética."
Reposição
Algumas doenças oculares são causadas por um defeito em um único gene transmitido por membros da família. A maioria afeta a retina (o tecido sensível à luz que reveste a parte posterior do olho) ou a coroide (a camada de vasos sanguíneos entre a retina e a parte branca do olho). O gene anormal impede que certas células oculares funcionem corretamente, o que pode causar problemas de visão. Às vezes, esses problemas pioram com o tempo.
Na terapia genética, esses genes defeituosos são substituídos por cópias saudáveis para corrigir a causa subjacente da doença — potencialmente para toda a vida. Os genes funcionais são entregues às células durante um procedimento no mesmo dia.
Com o mapeamento do genoma humano, foram identificados genes específicos associados a uma série de doenças oculares hereditárias da retina, incluindo amaurose congênita de Leber (LCA), síndrome de Usher, doença de Stargardt e retinite pigmentosa.
Fonte: Universidade de Saúde e Ciência de Oregon