Estudo conduzido por pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e do Institut Pasteur de São Paulo (IPSP) mostrou, pela primeira vez, que existe uma associação entre a síndrome congênita do vírus zika (SCZ) e o transtorno do espectro autista (TEA).

 
 

Dados publicados na revista "Biochimica et Biophysica Acta – Molecular Basis of Disease" apontam que decorrências comuns da síndrome – como a neuroinflamação e problemas na formação da conexão entre os neurônios cerebrais (sinapses) – podem ser fatores de risco para o TEA. A pesquisa recebeu apoio da FAPESP por meio de dois projetos (17/27131-9 e 18/16748-8).

 

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“O autismo é multifatorial, tem inúmeras causas genéticas e ambientais. Neste estudo, conseguimos provar que a síndrome congênita do zika pode ser mais um desses fatores ambientais. Isso quer dizer que toda criança cuja mãe foi infectada pelo vírus durante a gestação vai ter autismo? Não. Nosso estudo mostrou, no entanto, que nos casos de síndrome congênita do zika o risco de autismo está aumentado”, explicou à Assessoria de Imprensa do ICB-USP Patrícia Beltrão Braga, uma das autoras do artigo.

 

 

Segundo a cientista, já haviam sido descritos casos de crianças afetadas concomitantemente pela síndrome congênita do zika e o transtorno do espectro autista. “No entanto, eram apenas relatos de caso. Eu mesma fiz a análise genética de um desses casos e não encontrei nenhum gene relacionado ao autismo. Então, poderia ser só uma coincidência”, comentou.




 

No trabalho recentemente publicado, no entanto, os pesquisadores puderam fazer uma investigação sobre os mecanismos que estariam afetando o sistema nervoso e causando o comportamento autista em crianças com síndrome congênita do zika.

 

Metodologia

 

Os pesquisadores realizaram experimentos com organoides cerebrais produzidos em laboratório e infectados com o zika. Também foram feitos testes com camundongos infectados pelo vírus, que manifestaram um tipo de comportamento chamado “autista-like”. O estudo também investigou os dados de uma coorte composta por 137 crianças que nasceram com a síndrome congênita do zika. 


 

“No ensaio com os minicérebros verificamos que havia uma série de alterações – como diminuição de sinapses, aumento de morte celular, neuroinflamação, alteração na captação de glutamato – que impediam o bom funcionamento dos neurônios. Notamos que a inflamação observada nas células do sistema nervoso parecia ser suficientemente compatível para causar alterações no comportamento de uma criança”, relatou Beltrão-Braga.

 

A origem do problema, de acordo com a pesquisadora, está nos astrócitos – células neuronais que dão suporte ao funcionamento dos neurônios. “É o astrócito que dá sustentação, nutrição ao neurônio. Ele também elimina substâncias tóxicas no cérebro. Como o astrócito infectado funciona mal, ele não dá todo o suporte possível para a sobrevivência do neurônio. Além de funcionar mal, ele parece estar produzindo citocinas inflamatórias, o que piora o funcionamento do sistema nervoso”, disse.

 

Os pesquisadores ressaltam que é provável que o autismo nas crianças com síndrome congênita do zika seja um reflexo do astrócito alterado por consequência da infecção provocada pelo vírus. “Acreditamos que a presença do vírus durante o período embrionário pode desencadear uma reprogramação epigenética, quando a exposição ao ambiente adverso pode alterar a regulação de genes durante o desenvolvimento embrionário”, destacou a professora do ICB.

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