Cordão de Girassol vai identificar pessoas com deficiência oculta -  (crédito: CMBH / Divulgação)

O cordão de girassol é um acessório discreto utilizado como forma de identificar as pessoas com deficiências ocultas para sinalizar que elas podem precisar de suporte

crédito: CMBH / Divulgação

 

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 45 milhões de brasileiros possuem algum tipo de deficiência, das mais diversas modalidades. Dentre essas, existe um tipo considerada invisível, onde a pessoa portadora acaba sofrendo ainda mais discriminação e negligência. São as deficiências ocultas, aquelas que não são visíveis nem aparentes, mas acometem milhões de pessoas.

 

Dezembro contempla uma ampla gama de campanhas de conscientização ligadas à saúde, incluindo o Mês Internacional da Pessoa com Deficiência, um momento para refletir sobre os desafios enfrentados e melhorias que devem ser feitas para garantir acessibilidade e inclusão social. Com isso, Caroline Oliveira Romão, psiquiatra e professora da UniBH, esclarece as principais dúvidas sobre as deficiências ocultas - que são tão pouco comentadas. Confira:

 

 

1.  O que são deficiências ocultas?

 

Deficiências ocultas são condições físicas, mentais e/ou neurológicas que não são visíveis a olho nu, mas que impactam significativamente a vida da pessoa e, dessa forma, podem ser mal compreendidas, subestimadas ou muitas vezes ignoradas. Uma deficiência não visível é aquela em que você olha para a pessoa e não identifica nenhuma da deficiência aparente. Para ajudar nesta identificação social, foi criado, em 2016, no Reino Unido, o cordão de Girassol, como parte de uma iniciativa para tornar os aeroportos mais acessíveis. O método já é utilizado também aqui no Brasil, bem como o cordão de Quebra Cabeça (simbolizando o autismo) e do Infinito (representando as condições neurodivergentes). 

 

É um acessório discreto utilizado como forma de identificar as pessoas com deficiências ocultas para sinalizar que elas podem precisar de suporte, compreensão ou paciência em determinada situação. Trata-se de um cordãozinho verde com estampa de girassol que é muito usado em aeroportos, estações, eventos públicos e outros lugares que ajudam a promover a inclusão e a acessibilidade.

 

Pode usar o cordão de girassol todas as pessoas que têm alguma deficiência oculta, como autismo, TDAH, epilepsia, doenças crônicas como esclerose múltipla, perdas auditivas moderadas e qualquer outra deficiência não visível que requer algum suporte.

 

2. Quais as principais deficiências ocultas?

 

As principais são:

 

  • Transtornos do espectro do autismo
  • Deficiências auditivas (leves e moderadas)
  • Alguns transtornos de aprendizagem, por exemplo, a dislexia
  • Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)
  • Doenças mentais mais graves como esquizofrenia, epilepsia
  • Algumas doenças autoimunes e neurológicas, por exemplo, Parkinson

 

3. Pessoas com deficiência oculta sofrem mais com discriminação?

 

O fato da deficiência não ser visível gera sim muita discriminação, porque eu posso olhar para a pessoa e não entender, por exemplo, porque ela vai ter uma prioridade na fila e isso pode causar um julgamento das pessoas. As pessoas que olham de fora podem achar que a pessoa está tentando se aproveitar daquela situação, então essa falta de compreensão e de empatia agrava muito o estigma dessas doenças. Por isso, a criação do cordão de girassol, que eu comentei, para que elas possam ser identificadas com mais facilidade, evitando esses processos de discriminação. 

 

É importante também dizer que o fato dessas deficiências ocultas não serem visíveis, faz com que as pessoas não acreditem em seus diagnósticos, ou nem os considerem com uma deficiência. Tem a questão também dos espectros, por exemplo, o transtorno do espectro do autismo, que pode ser mais leve, moderado, severo, e isso cria essa ideia de que um problema mais leve não vai ser considerado uma deficiência, sendo que, mesmo as questões mais leves, têm um impacto muito grande na vida das pessoas.

 

3. O que o SUS disponibiliza para estas deficiências?

 

O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza os mesmos recursos para todas as deficiências. Então, ele oferece o diagnóstico e acompanhamento médico especializado, como neurologista, psiquiatra ou outro profissional que for necessário; tratamento medicamentoso, reabilitação e terapias; pode ser necessário fisioterapia, psicoterapia e fonoaudiologia. Nesse caso, cada deficiência vai ser tratada de acordo com a necessidade gerada pela própria deficiência. Programas de saúde mental, suporte profissional, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). 

 

4. Como trabalhar a inclusão nesses casos?

 

A primeira coisa é sempre priorizar a educação e conscientização das pessoas para quebrar os estigmas. Criar mais políticas públicas que assegurem acessibilidade e equidade nos ambientes de trabalho, de estudo e nos ambientes sociais no geral. Adaptação de métodos de ensino e de avaliação, por exemplo, como o tempo adicional para as provas, as provas em salas separadas, a possibilidade de ter um ledor, no caso das pessoas com dislexia, etc.

 

E, seja o ambiente que for, é necessário ser inclusivo - respeitando as limitações e oferecendo sempre o suporte que aquela pessoa necessitarem. A educação e a conscientização sobre esses problemas é prioridade, pois eles precisam ser conhecidos para que a sociedade consiga incluir as pessoas com deficiência.  

 

5. Quais as especialidades médicas responsáveis pelas deficiências consideradas ocultas?

 

Podem ser várias especialidades, dependendo do diagnóstico. Elas são frequentemente tratadas pela psiquiatria, neurologia, psicologia, algumas deficiências auditivas necessitam de otorrino, laringologistas. Para as doenças autoimunes já entra para a reumatologia, os clínicos gerais, fonoaudiologia, terapia ocupacional, entre outras.

 

6. Elas costumam ser diagnosticadas em qual fase da vida?

 

Vai depender da condição. Algumas dessas deficiências ocultas, talvez as que a gente mais se lembra, são o autismo, o déficit de atenção. Eles geralmente surgem na infância, mesmo que o diagnóstico seja feito de forma tardia. Os sintomas já vêm desde o início da vida e outros podem surgir no início da fase adulta ou com o envelhecimento, vai depender mesmo da condição.

 

7. Uma pessoa portadora de deficiência oculta pode viver normalmente com independência?

 

Sim. Muitas pessoas com deficiências ocultas vivem de forma independente, principalmente se elas tiverem o suporte adequado e o diagnóstico correto. Muitas vezes esse diagnóstico tem que ser feito o mais precocemente possível para que seja possível dar esse suporte e criar o acompanhamento e as adaptações que forem necessárias para aquela pessoa. Claro que o impacto da deficiência em si vai depender da gravidade de cada caso e de cada condição. Como é o exemplo do transtorno do espectro do autista, onde as intervenções de nível 1, que é um autismo considerado mais leve, com menos sintomas, para um autismo de nível 3, que é um autismo considerado mais severo, com mais sintomas.

 

 

Elas podem ser parecidas, mas o ganho de habilidades pode ser diferente e, com o tempo, você pode estimular um pouco menos essa criança que está no nível 1 e você precise continuar estimulando mais fortemente a que está no nível 3, e isso vai variar no impacto que vai ter na vida dela lá pra frente. O trabalho é sempre esse, independente da gravidade da condição, estimular sempre a independência e a autonomia.

 

8. As deficiências ocultas geralmente têm tratamento? E cura?

 

Muitas delas não terão uma cura definitiva. Porém, muitas vão ter tratamentos que ajudam muito a melhorar a qualidade de vida, como terapias, medicamentos, práticas de reabilitação. Vai depender da condição, mas no geral é possível ter tratamento e ter uma melhora na qualidade de vida, ainda que não seja possível ter uma cura.

 

 

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