EM Minas entrevista Henrique Salvador, o mais novo integrante da ANM
Durante a conversa, Henrique Salvador fala sobre os desafios da prática médica e de ser um dos gestores de uma empresa familiar
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Siga noReferência em ginecologia e mastologia no Brasil, Henrique Salvador, presidente do Conselho de Administração da Rede Mater Dei e, agora, titular da cadeira nº 61 da Academia Nacional de Medicina (ANM), participou do EM Minas, programa da TV Alterosa em parceria com o Estado de Minas e o Portal UAI, exibido nesse sábado (29/3).
Responsável por viabilizar o parto do primeiro bebê de proveta de Minas Gerais - técnica conhecida como fertilização in vitro, Henrique foi eleito imortal na Secção de Cirurgia da ANM, tendo como patrono Luís da Cunha Feijó, reconhecido como o primeiro praticante da cesariana no Brasil.
Ao longo de sua carreira, Henrique se especializou em mastologia em instituições renomadas, como o Guy’s Hospital (Inglaterra) e a Universidade de Pittsburgh (EUA). Também possui especialização em reprodução humana em universidades da Alemanha e do Canadá. A busca constante por aprimoramento, como ele próprio destaca, trouxe ao Brasil novas técnicas na área do câncer de mama, beneficiando inúmeras mulheres.
Filho de José Salvador Silva, fundador do Hospital Mater Dei, e pai de José Henrique Salvador, atual CEO da Rede, Henrique enfatiza que a gestão familiar exige estudo e aperfeiçoamento contínuos, mas ressalta que a participação de profissionais externos, comprometidos com o cuidado ao paciente, enriquece ainda mais a instituição. “O maior diferencial do Mater Dei é ter uma família profissionalizada, mas também contar com profissionais que não fazem parte da família fundadora e que têm o mesmo amor e a mesma paixão pelo hospital”, afirma.
Confira a íntegra da entrevista, exibida no EM Minas:
Henrique, você é uma autoridade médica respeitada no mundo inteiro. Essa posse na ANM coroou sua carreira?
Sem dúvida. A Academia Nacional de Medicina é uma entidade quase bicentenária – completará 200 anos em 2029. Foi fundada em 1829 por Dom Pedro I e tem como principal objetivo emitir pareceres, discutir temas relevantes da prática médica e fomentar o ensino e a pesquisa. Todas as quintas-feiras, os acadêmicos se revezam apresentando temas atuais de interesse médico.
Participar deste seleto grupo de médicos, no Brasil, é, sem dúvida, um marco na minha trajetória. Eu me formei há 42 anos, na UFMG, e construí uma carreira que combinou assistência médica, pesquisa, pedagogia e gestão. De certa forma, integrar a ANM é a cereja do bolo da minha trajetória profissional.
Você terá tempo para se dedicar à Academia? Como conciliar família e gestão?
Sempre fui muito intenso na minha atividade profissional. Durante anos, comecei a operar às 6h30 da manhã, conciliando o trabalho no consultório, as cirurgias e a atuação em entidades de classe. Fui presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia e da Associação Nacional de Hospitais Privados, além de diretor médico da Rede Mater Dei por mais de 30 anos, depois CEO e, atualmente, presidente do Conselho.
As atividades na Academia não são contínuas, mas intermitentes, o que me permite conciliar os compromissos. Pretendo participar ativamente.
O Hospital Mater Dei é um dos principais do Brasil. Quantos anos tem a instituição?
Papai fundou o Mater Dei em 1º de junho de 1980. Este ano, completamos 45 anos. Hoje, temos três gerações da família envolvidas na gestão. Meu pai continua indo ao hospital e é o presidente de honra do Conselho. Minha mãe também participa, como presidente do Conselho de Família. Minhas irmãs, Maria Norma e Márcia, são vice-presidentes do Conselho. Meu irmão, Renato, também integra o Conselho.
Na terceira geração, temos o José Henrique, atual CEO, a Renata e o Felipe como vice-presidentes, e a Lara como diretora de Inovação e Experiência do Paciente. Além da família, contamos com uma grande equipe de diretores que se formaram no Mater Dei ou vieram do mercado.
Hoje, a Rede tem 8,5 mil colaboradores com vínculo CLT e cerca de 10 mil médicos credenciados. É um ecossistema de saúde relevante no Brasil, com um foco muito forte em qualidade, segurança e acolhimento. É identificar que cada ser humano é diferente um do outro.
O Mater Dei foi pioneiro na hospitalidade e infraestrutura diferenciada. Essa tendência se consolidou?
Eu acho que o importante é o equilíbrio de muitos pilares, vamos dizer assim. Tem a estrutura - aquilo que o paciente percebe, mas tem um outro lado que passa despercebido: o investimento que se faz em pessoas. Temos hoje, por exemplo, mais de 20 programas de residência médica reconhecidos pelo MEC, formando médicos com características diferenciadas. Também desenvolvemos um programa de formação para técnicos de enfermagem e uma pós-graduação para enfermeiros, desde a inauguração do Mater Dei Contorno, em 2014. Isso é muito importante, porque quando se trata de prestação de serviço, as pessoas fazem toda a diferença.
Muitos dizem que empresas familiares não conseguem crescer sem profissionalização. Como vocês lidaram com isso?
Sem dúvida, em meados dos anos 1990, fomos para, no meu modo de entender, uma das principais, senão a principal, escola de negócios do Brasil, a Fundação Dom Cabral. Lá, além de aprender outras coisas ligadas à gestão, estruturamos um plano de sucessão da segunda para a terceira geração e para as futuras.
Temos critérios claros para que familiares ocupem cargos de liderança. Mas, mais do que isso, o diferencial do Mater Dei é contar com profissionais que não têm o sobrenome da família fundadora, mas que têm o mesmo amor e paixão que os fundadores têm.
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A Rede Mater Dei se expandiu para outros estados. Como isso aconteceu?
Até 2010, tínhamos apenas o Mater Dei Santo Agostinho, nasceu ali um bloco, em 1980. Em 2000 nós inauguramos o bloco 2. Depois, nós chegamos a conclusão que precisávamos crescer, participamos de um leilão do terreno do antigo mercado Distrital da Barroca e em 2014, o Mater Dei da Contorno foi construído, foi inaugurado para a Copa do Mundo em primeiro de junho daquele ano. Depois, em janeiro de 2019, veio o Mater Dei Betim-Contagem.
Cada um deles tem uma história de localização, negociação, aquisição do terreno, contratação do projeto de arquitetura. Nós mesmos construímos os hospitais com a nossa equipe, com dois engenheiros que estão conosco desde a fundação, o Marco Serra e o Arnaldo Silva.
Depois, mais adiante, em 2021, nós abrimos o capital do Mater Dei na bolsa de valores, porque identificamos que precisávamos para conseguir expandir. Com isso, chegamos a conclusão que era o momento também de sair de Belo Horizonte. Então, em maio de 2022, inauguramos o Mater Dei Salvador, o primeiro fora de BH. Em abril de 2021, tínhamos aberto o capital da Rede Mater Dei na bolsa, fizemos algumas aquisições, como a de dois hospitais em Uberlândia (Mater Dei Santa Genoveva e o Mater de Santa Clara).
Compramos um hospital em Goiânia, o Mater Dei Goiânia, fomos para Feira de Santana, a 100 km de Salvador, achávamos que fazia sentido irmos para a segunda cidade da Bahia e compramos a Mater Dei Emec e fomos expandindo.
Recentemente, em agosto do ano passado, inauguramos também o Mater de Nova Lima. Então hoje nós somos nove hospitais, somos quatro na Região Metropolitana de Belo Horizonte, dois em Uberlândia, um em Goiânia e dois na Bahia.
Agora vamos construir, a partir do ano que vem, um hospital na zona norte de São Paulo, no bairro de Santana. Nós vamos fazer uma associação com a Bradesco, que tinha um terreno muito bem localizado, onde tem poucos hospitais. O projeto já está em andamento e devemos iniciar as obras entre o final deste ano e o início de 2026.
Quando vocês inauguraram o hospital em Betim-Contagem, muitos comentaram que a Rede estava querendo se popularizar. Como você vê essa questão?
Acredito que o essencial é ter fundamentos para um atendimento diferenciado. Se você foca na qualidade intrínseca do que se oferece, como, por exemplo, manter um dos menores índices de infecção, um bom tempo de resposta no procedimento porta-balão para infartados no pronto-socorro e na abertura de artérias cerebrais em casos de acidente vascular cerebral (AVC), seguindo as melhores práticas mundiais, isso o Mater Dei acompanha tudo. Então, isso é o que eu chamo de qualidade daquilo que você oferece.
A mesma coisa vale para a segurança, que envolve processos para reduzir erros na assistência hospitalar; eficiência, que significa fazer mais com menos recursos e utilizá-los da melhor forma possível; e experiência do usuário: é saber acolher adequadamente aquela pessoa. Se você foca nisso, independentemente do nicho que escolhe atender, você acaba atendendo bem.
No Mater Dei, por exemplo, 90% dos atendimentos são para pacientes de planos de saúde. Claro, temos algumas operadoras que atendem o presidente e a diretoria da empresa, mas atendemos também quem trabalha no chão de fábrica, o operário, quem trabalha na manutenção, na higienização. Sempre buscamos atender da mesma maneira. Isso talvez seja uma das marcas do Mater Dei - entrou, deitou no leito, o atendimento é o mesmo para todo mundo e tem que ser assim. É o que se sustenta ao longo do tempo.
Todo mundo que chega em um hospital está desesperado. Como lidar com isso?
Lidar com saúde e doença exige atenção especial, pois a saúde é o maior patrimônio do ser humano. Sem ela, nada mais faz sentido. Por isso, quem trabalha nessa área precisa ter princípios e, acima de tudo, gostar de gente e do que faz.
Você se especializou em mastologia desde o início da carreira?
Na verdade, me formei pela UFMG, em 1982, e fiz residência em ginecologia e obstetrícia aqui no Brasil. Depois, passei quase três anos no exterior, me especializando em reprodução humana e, principalmente, mastologia. Fiquei mais tempo na Inglaterra, onde fiz residência nessa área, além de visitar outros serviços.
Naquela época, costumo dizer o seguinte: não havia telefone celular nem internet. O conhecimento estava restrito ao local. Hoje, com um computador, temos acesso a tudo que acontece no mundo. Durante o período fora, trouxemos a técnica de fertilização in vitro para Minas Gerais e realizamos o primeiro bebê de proveta do estado. Eu, Ricardo Marinho e Walter Pace fomos os três médicos responsáveis na época.
Também trouxemos diversas técnicas inovadoras na área do câncer de mama para o Brasil, implementando muitas delas no Mater Dei. Acho que beneficiou inúmeras mulheres e contribuiu, inclusive, para a cura da doença. Foi um período de intensa produção científica e acadêmica - publiquei mais de 200 artigos e livros.
Hoje há mais casos de câncer de mama ou ele está sendo mais diagnosticado? No passado, parecia menos comum.
O câncer de mama ainda é o tipo mais frequente entre as mulheres no mundo inteiro. É uma doença associada ao envelhecimento. O aumento da expectativa de vida, aliado a fatores como má alimentação, sedentarismo e poluição, contribuem para sua incidência.
Além disso, os métodos de diagnóstico melhoraram muito. A mamografia, principal ferramenta para a detecção precoce, evoluiu significativamente e consegue identificar lesões em estágios muito iniciais. Quanto mais cedo o câncer é diagnosticado, maiores são as chances de cura. Isso ajudou a desmistificar a doença.
Eu sou de uma época em que nem se falava a palavra “câncer", mas se falava “aquela doença”. Hoje, o câncer pode ser tratado como condição crônica, assim como diabetes e hipertensão, exigindo acompanhamento contínuo.
Qual é o principal conselho que você dá às mulheres?
O primeiro passo é ter um médico de referência, seja um ginecologista ou um mastologista, mesmo para aquelas sem fatores de risco. Mulheres sem histórico familiar devem fazer mamografia anualmente a partir dos 40 anos. Já aquelas com histórico familiar forte, especialmente em parentes de primeiro grau que tiveram a doença precocemente, precisam de atenção redobrada.
Qual o grande princípio que a gente precisa ter na vida, não só nessa especialidade, nesse campo da medicina? O melhor médico que existe somos nós para nós mesmos. Praticar exercícios, manter uma alimentação equilibrada, evitar o cigarro e o consumo excessivo de álcool, cultivar relações sociais prazerosas e encontrar propósito no trabalho são fatores diretamente ligados à longevidade e ao bem-estar.
Muitas mulheres optam pela retirada preventiva das mamas ao descobrir que têm histórico familiar. Essa é uma prática comum ou recomendada?
Não é algo comum e se aplica apenas a um grupo muito específico de pacientes. Algumas mulheres jovens fazem testes genéticos para detectar mutações ligadas ao câncer de mama e, quando essas alterações estão presentes, o risco de desenvolver a doença ao longo da vida é muito grande.
Nesses casos específicos, a mastectomia profilática bilateral com reconstrução imediata pode ser indicada, pois reduz drasticamente o risco. Foi o que aconteceu com Angelina Jolie, cujo caso gerou grande repercussão e trouxe mais visibilidade para o tema. No entanto, essa não é uma abordagem recomendada para todas as mulheres, apenas para um pequeno grupo de pacientes com alto risco genético.
Falando em figuras públicas, muitos famosos já usaram os serviços do Mater Dei. Essa referência orgulha a equipe?
Nosso objetivo é sempre atender todas as pessoas da mesma maneira. Alguns casos se tornam conhecidos porque envolvem figuras públicas, mas o nosso dia a dia não é o atendimento dessas pessoas. São milhares de cirurgias, exames e internações todos os meses, incluindo centenas de pacientes em terapia intensiva.
Além disso, queremos dar visibilidade a histórias de pessoas que confiam no Mater Dei, mas que não são famosas. Nos 45 anos da Rede, estamos destacando isso. O hospital tem uma característica que nem todos os hospitais possuem: atendemos desde a pré-concepção, passando pela pediatria e maternidade, até a geriatria, cobrindo todas as especialidades médicas. Isso nos torna um verdadeiro hospital da família.
É um corpo clínico muito aderido, são profissionais muito competentes que enxergam no Mater Dei o local ideal para desenvolver seu trabalho. Agora, nos 45 anos da Rede Mater Dei, vamos ver isso.
O hospital de Nova Lima foi planejado como maternidade ou já nasceu como um hospital geral?
Ele foi projetado como hospital geral, com pronto-atendimento em diversas especialidades, como pediatria, maternidade, clínica médica, cirurgia e ginecologia-obstetrícia. Conta com um bloco cirúrgico bem equipado, além de exames de diagnóstico, como tomografia, ressonância e ultrassonografia. O hospital também tem heliponto e está estrategicamente localizado, complementando muito bem os outros três hospitais da Rede na Grande BH.
Você é um dos maiores criadores de cavalos da raça Campolina no mundo. O haras já tem mais de quatro décadas?
Nossa história com o agro vem de muitos anos. Meus dois avós, tanto paterno quanto materno, eram fazendeiros. O pai do meu pai era tropeiro, um homem que começou a vida com pouca escolaridade, mas com uma grande capacidade de trabalho. Ele comprava mantimentos nos grandes centros e os vendia em pequenas localidades, transportando tudo no lombo de burro. Seu nome era Pedro Sabino.
Meu outro avô, materno, era um pequeno fazendeiro em Feira de Santana, no sertão da Bahia. Minha mãe é de lá. Por isso, sempre tivemos uma forte ligação com a fazenda e o meio rural. Essa paixão está presente no meu pai, em mim, no Zé Henrique, no meu irmão, nas minhas irmãs e sobrinhos. Todos nós somos muito ligados ao campo.
Há 55 anos, quando eu tinha cerca de 12 anos - hoje estou prestes a completar 67, começamos a criar a raça Campolina, que surgiu em Entre Rios de Minas. Quando você menciona que somos um dos maiores criadores do mundo, vale lembrar que o Campolina existe apenas no Brasil, pois foi desenvolvido aqui. A criação desses cavalos é uma grande paixão para nós. É onde relaxamos, convivemos com amigos de diversas áreas, como fazendeiros, engenheiros, empresários, médicos e funcionários do setor bancário. Criamos um ambiente onde nos sentimos à vontade.
Além dos cavalos, também trabalhamos com a criação de gado e o cultivo de milho e outras commodities. Isso se tornou um lazer que reúne nossa família e amigos. De fato, o Campolina é uma paixão, você tem razão.
Na época, Márcio Andrade, renomado criador de Campolina, Mangalarga, Piquera, Pônei e Pega, nos incentivou a criar Campolina. Foi uma referência para nós. Começamos de maneira despretensiosa, mas a criação cresceu e hoje é uma verdadeira paixão.
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