Influenciador digital promete combustível grátis e gera confusão em BH -  (crédito: Reprodução/Internet)

Influenciador digital promete combustível grátis e gera confusão em BH

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Na semana passada, o influenciador Gebê causou uma reunião de motoboys na Avenida Nossa Senhora do Carmo, na região Centro-Sul de BH.  Tudo isso por conta de uma promessa feita no Instagram:“Hoje eu vou encher mais de 500 tanques (de motos) de graça". Ele gastou pelo menos 25 mil em combustível. Além de Gebê, não é difícil encontrar conteúdos de influenciadores que prometem presentear os seguidores, mas o que há por trás dessa estratégia?


 

Rafaela Lotto, CEO da Youpix, consultoria de negócios para a Creator Economy, explica que presentes, doações e sorteios têm um principal objetivo por trás: o engajamento. “No fundo, o que todo mundo precisa, e é uma tentativa quase inglória, é de engajar. Porque tem uma leitura do cenário que é doar coisas, que acaba atraindo pessoas, desde o começo das redes sociais. São técnicas de engajamento, que mudam quando a estratégia para de funcionar”, aponta. 


Já Issaaf Karhawi, autora do livro “De blogueira a influenciadora”, atenta para duas questões importantes. Em primeiro lugar,  ela acredita que existe um nicho de produção de conteúdo focado nesse tipo de ação. E isso não surgiu com as redes sociais: na TV aberta, existem vários programas que focam em ações parecidas. 


O segundo ponto envolve os influenciadores que não são do nicho, mas fazem uma ação pontual do tipo. Nesse caso, é uma estratégia distinta, que busca  mobilizar as audiências e construir um certo capital ou consolidar um certo capital reputacional. “Só do influenciador conseguir construir uma comunidade ao redor dele, que tem interesse nesse tipo de conteúdo, já é um resultado. Já aponta para o interesse nesse tipo de brincadeira de doações e etc. Me faz lembrar, por exemplo, da Ellen Mil Grau, que faz faxina nas casas das pessoas. É um tipo de conteúdo pensado com essa intenção de se relacionar com o público, de se engajar com a audiência”, aponta. 


Doação de gasolina valeu a pena?

 

Citando o caso de Gebê, a CEO da Youpix destaca que levar a comunidade virtual para o “mundo real” é uma coisa rara. Ela compara com os flash mobs, a aglomeração instantânea de pessoas em um local público para realizar uma ação previamente organizada, muito comum há cerca de uma década. 


“É mobilizador. Uma coisa é você conseguir um like, outra coisa é você fazer as pessoas saírem de casa e criar uma comunidade. Pode ser o início de uma coisa muito legal ou uma reunião para fazer coisa errada. É uma das coisas mais difíceis”, destaca. 


Nesse caso em específico, a própria promessa vira um conteúdo. E a palavra do influenciador é o suficiente para fazer as pessoas acreditarem e as coisas acontecerem. Mas esse tipo de ação impacta em outra questão: a ocupação do espaço público. 


 

Isabella Damasceno, advogada especialista em direito público, chama atenção para uma “onda de influenciadores que de forma muito irresponsável promovem a ocupação do espaço público de forma desorganizada”. Mas isso não se aplica para todos os casos.


“A ocupação em locais abertos deve ser incentivada, mas o direito de um vai até onde o de outro começa. Pacificamente, qualquer pessoa pode se reunir em local aberto, sem autorização, desde que não atrapalhe outra reunião”, aponta. Mas caso o encontro cause algum dano ao trânsito e aos moradores da região, por exemplo, a história muda. 

 


“Em BH, tem um decreto sobre a ocupação urbana. Dependendo das características do evento, é obrigatória a comunicação à prefeitura, para não atrapalhar a fluidez do trânsito e dos pedestres, além de não atrapalhar o espaço de quem mora. Depende do barulho, do incentivo. O influenciador tem que ter responsabilidade. Pode sim fazer a utilização do espaço público, mas quando reúne grande número de pessoas, precisa seguir esse regulamento para haver segurança e preservar a coisa pública”, acrescenta. 

 

Vale tudo por engajamento?


O principal ponto negativo dessas estratégias é que talvez elas não funcionem em longo prazo. “Esse é o principal efeito colateral. Quem está fazendo na hora não mede que as ações atraem as pessoas interessadas no prêmio. A dificuldade é sustentar isso. Mesmo quem viraliza por acaso. As pessoas esperam ver mais daquilo, e se não tem mais, elas param de seguir. É uma base grande de seguidores e baixo engajamento”, explica Lotto.


No caso de sorteios, é preciso atenção desde o começo da estratégia. Segundo Isabella Damasceno, atualmente, não existe uma legislação que regulamenta os sorteios nas redes sociais e é aplicada a mesma regra das Bets no Brasil. “Dependendo do valor (do prêmio) traz uma série de requisitos. Se há venda de bilhetes, tem que ser registrado na Caixa Econômica Federal. Mas existe uma lacuna de vários casos que a gente vê”, reflete.


Ela ainda chama atenção para outro ponto: o influenciador precisa ter responsabilidade tanto a respeito das regras do sorteio, quanto da premiação. “A pessoa pode responder por estelionato, se houver alguma divergência em relação às regras. Além disso, tem que olhar a contrapartida. O sorteio até vale, desde que você tenha responsabilidade do prêmio e das regras, que não tenha falseado nada. É uma prática que vale hoje no brasil”, aponta.

 

 

Além das questões legais, na esfera digital, Issaaf Karhawi vê uma estratégia um pouco diferente dos presentes. “Acho que essas iniciativas têm como intenção reforçar o vínculo construído com os seguidores, pode ser um momento importante de convocar a audiências e sinalizar que essa audiência é imprescindível para a atuação do influenciador para produção de conteúdo que ele faz. Mas eu não acredito que sorteios sejam necessários para que os influenciadores construam uma relação com as suas audiências”, acredita. 


Ela vai além e desencoraja esse tipo de ação, já que existem outras formas de fortalecer vínculos com a audiência, com um diálogo mais aberto com os seguidores. “Às vezes você presenteia a audiência e isso pode ter um efeito rebote, um efeito colateral negativo, que é entender que a relação que se dá ali é só mercadológica, só se dá por conta de trocas econômicas, que não tem mais nada ali em jogo. Então tudo passa por um gerenciamento da relação que se dá entre audiências e seguidores”, explica. 


Na dúvida, Rafaela Lotto aconselha que os influenciadores analisem bem antes de criar uma estratégia do tipo. “Os influenciadores precisam entender o que querem construir enquanto imagem. Porque eles não são os que as marcas escolhem para trabalhar, porque não querem ser atrelados a quem tem uma imagem potencialmente errada”, alerta.