O cântico de Dona Nair, rainha-mãe do Quilombo dos Marinhos, em Brumadinho, entoa as lamúrias e dores de seus antepassados. A voz marcante corta o vento, se expande no horizonte e tem poder de cura. Cura da alma, principalmente. Benzedeira, raizeira e curandeira, a matriarca de um dos territórios sagrados em Minas Gerais nos convida a conhecer a história de seu povo.


 

Hoje, Dia da Consciência Negra, a necessidade de compreender e valorizar a história e cultura do povo negro é cada vez mais urgente. No Brasil, onde a população negra representa mais da metade da população total, o afroturismo surge como uma nova modalidade de turismo que promove o resgate e a valorização da cultura e da história afro-brasileiras.

O afroturismo no Quilombo do Sapé, em Brumadinho, é uma oportunidade de conhecer as tradições, a história de luta e a cultura de um povo

Carlos Altman/EM

O afroturismo, também chamado de turismo étnico ou turismo afro, visa valorizar o patrimônio material e imaterial da população negra. Ele pode ser praticado por qualquer pessoa que queira aprender mais sobre a história e cultura afro-brasileira, independentemente de sua etnia.

Importância do afroturismo

Xequerê, instrumento musical feito com cabaça, é entoado nas apresentações do Grupo Negro por Negro

Carlos Altman/EM

Conhecer a história por trás da cultura negra é importante para todas as etnias. No Brasil, onde a miscigenação é uma realidade, a história do povo negro é a história de todos os brasileiros. O afroturismo é uma oportunidade de aprender sobre a resistência e a luta do povo negro contra a escravidão e o racismo. É também uma oportunidade de conhecer as riquezas da cultura afro-brasileira, que se manifestam na música, na dança, na religião, na culinária e na arte.

Marcelo Freixo, presidente da Embratur, ressalta a importância de divulgar, desenvolver e incentivar o afroturismo no Brasil: “É um mercado que a gente nunca organizou nos 57 anos da Embratur. Se você olhar para o Rio de Janeiro, a pequena África, se você olhar para Salvador, que tem o maior número de negros fora da África, olhar para Minas Gerais e Maranhão, você tem muitos destinos com uma história de afroturismo muito forte. E, o mercado internacional está disposto a fazer essa visita. Tem diversas agências de viagens norte-americanas, principalmente no Sul dos EUA, que se especializaram e só fazem afroturismo. E pediram pra gente organizar os destinos, pois eles têm demanda. Isso é geração de emprego e renda, e de certa forma, de identidade que faz com que o Brasil reconheça a sua história africana aqui dentro”.

Roteiros

O Brasil é um país com uma rica história e cultura afro-brasileira. Existem diversos roteiros de afroturismo disponíveis em todo o país, que permitem conhecer diferentes aspectos da cultura e da história do povo negro.


Minas Gerais

No Quilombo Rodrigues, em Brumadinho, visitante participam de oficinas de música e dança . Apresentação do Grupo Negro por Negro se destaca

Carlos Altman/EM

Minas Gerais tem uma história rica em relação aos quilombos, que eram comunidades formadas por afrodescendentes que buscavam refúgio da escravidão. Alguns dos quilombos mais conhecidos em Minas Gerais incluem:

  • Quilombos Sapé, Rodrigues, Guimarães e Marinhos: Localizados no município de Brumadinho são referências culturais em Minas. Projeto Céu de Montanhas oferece visitas guiadas aos territórios onde os visitantes imergem na cultura, gastronomia e vivências do povo negro.

  • Quilombo do Campo Grande: Localizado no município de Três Pontas, o Quilombo do Campo Grande é um dos mais antigos de Minas Gerais. Foi reconhecido oficialmente em 2005.

  • Quilombo de São José da Serra: Situado em São José da Serra, distrito de Jaboticatubas, este quilombo é conhecido por suas tradições culturais e pela luta pela preservação de sua história.

  • Quilombo do Sapé: Localizado em São Roque de Minas, próximo ao Parque Nacional da Serra da Canastra, o Quilombo do Sapé tem uma forte presença na preservação da cultura afro-brasileira na região.

  • Quilombo de Monte Alegre: Está situado no município de Itapecerica e é uma comunidade remanescente de quilombo que preserva suas tradições culturais.

  • Quilombo do Mocambo: Localizado em Ouro Preto, é um dos quilombos mais conhecidos da região e desempenhou um papel importante na história local.

Segundo os dados divulgados pelo IBGE em 27 de julho deste ano,, existem em Minas Gerais 18 territórios titulados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O número real ainda é desconhecido, mas, cerca de 365 quilombos mineiros já foram reconhecidos pela Fundação Cultural Palmares.


Rio de Janeiro:


O estado abriga uma significativa herança cultural africana, com destaque para o Cais do Valongo, um dos principais portos de entrada de escravos no Brasil; os bairros Santo Cristo, Saúde e Gamboa, que abrigam importantes comunidades negras; e a Igreja do Rosário e São Benedito dos Homens Negros, uma das mais antigas igrejas afro-brasileiras do país.

São Paulo:

Uma das principais rotas do afroturismo no Brasil está em São Paulo. Dentre os lugares de destaque estão a Rota da Liberdade, que percorre importantes locais da história da escravidão no Brasil; a Serra da Mantiqueira e do Mar, que abriga comunidades quilombolas; e a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, uma das maiores igrejas afro-brasileiras do país.

Alagoas:

O estado do Nordeste abriga alguns dos principais roteiros de afroturismo do país. Dentre os lugares de destaque estão o município de União dos Palmares, o maior quilombo do Brasil durante o período colonial; o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, que conta a história do quilombo; e a Serra da Barriga, onde ficava o quilombo.

Bahia:

Considerado o berço da cultura afro-brasileira, a Bahia de destaca no afroturismo. Dentre os principais roteiros estão a Igreja do Rosário dos Homens Pretos, em Salvador, uma das mais antigas igrejas afro-brasileiras do país; as casas de axé e terreiros, que guardam os rituais e a religiosidade afro-brasileira; e o Museu Afro-brasileiro, que conta a história da cultura afro-brasileira no Brasil.

São Luís:

A capital do Maranhão concentra a segunda maior população negra do país. Dentre os principais roteiros de afroturismo estão o Museu Cafuá das Mercês, que conta a história da escravidão no Brasil; o Tambor de Mina, uma religião afro-brasileira; e a Comunidade Quilombola de Alcântara, que preserva as tradições afro-brasileiras.

 

 


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