A agremiação da Ilha do Governador disputa a Série Ouro, segunda divisão do carnaval carioca, e tenta retornar à elite novamente. A bailarina é responsável direta pelo surgimento do termo baderna, que só existe no dicionário do português brasileiro, pelo furor que causava na época no Rio de Janeiro.
A escola de samba pede, em sua sinopse, que a menina das sapatilhas de ponta, transforme a Avenida em seu eterno palco. Além disso, vai mostrar os passos da maior estrela do lírico de um Rio de Janeiro ainda Imperial, conhecida por unir a cultura erudita com danças populares.
Nascida em Castel San Giovanni, na Itália, no dia 5 de julho de 1828, Franca Anna Maria Mattea Baderna desde cedo teve inclinação para dança. Foi aluna, então, do coreógrafo Carlo de Blasi e tornou-se membro do corpo de baile do Teatro Alla Scala de Milão.
Baderna foi primeira bailarina da Ópera de Milão e considerada uma das maiores da Europa já na adolescência, quando arrebatava as plateias dos principais teatros da Itália e da Inglaterra. Em solo britânico, teve uma temporada de sucesso, em 1847, no Covent Garden.
Quando retornou à Itália, Baderna viu seu país dividido e uma parte sob dominação da Áustria. A bailarina chegou a contribuir financeiramente para as conspirações patrióticas e pela unificação. Ela e seu pai eram seguidores de Giuseppe Mazzini, líder do movimento republicano, que foi derrotado.
Assim, com a derrota do movimento revolucionário que varreu a Europa em 1848, a chamada 'Primavera dos Povos', ela e o pai, médico e músico que tinha participado das revoltas, se exilam no Brasil. Desembarcaram no Rio de Janeiro no começo de agosto de 1849.
Baderna desembarcou no Brasil e aceitou um convite para se apresentar com sua companhia no Teatro São Pedro de Alcântara (atual Teatro João Caetano).
Apesar de serem consideradas 'escandalosas' para a sociedade escravista brasileira, as apresentações de Baderna faziam sucesso. Nelas, incorporavam danças afro-brasileiras, como o lundu, a umbigada e a cachucha, com movimentos pélvicos que causavam certa revolta.
O público aristocrata da época esperava que uma bailarina europeia trouxesse movimentos da 'alta cultura' da metrópole e não manifestações de povos escravizados.
Diferentemente deste pensamento, Baderna era uma democrata que no meio de um país escravista começou a frequentar as festas dos negros. Ela, então, ficou fascinada com as coreografias e trouxe os movimentos para o balé.
Essa característica trouxe uma identificação das classes mais populares com suas apresentações. Baderna foi essencial para a popularização do balé e dos teatros, que antes era exclusivos da elite.
A bailarina chegou a participar dessas danças ao ar livre, em locais como o Largo da Carioca, com os próprios escravos. Algo considerado um escândalo para a sociedade escravagista e repleta de preconceitos.
Em meio aos ataques, Marietta e os fãs revoltados eram defendidos por figuras como o escritor José de Alencar e o respeitado poeta e editor Francisco de Paula Brito.
Diante disso, a bailarina sofria represálias nas óperas, sua dança era deixada para o final ou então não renovavam o seu contrato. Os fãs, por sua vez, protestavam contra a direção dos teatros, boicotavam os espetáculos e faziam manifestações radicais.
Marietta Barnetta tinha um estilo transgressor, que unia a força da cultura negra, do feminino, da sexualidade e da arte popular. Foi pioneira também no ensino de dança no Brasil, com cursos profissionalizantes em 1851.
Os fãs da bailarina eram intitulados de 'badernistas' ou 'os badernas', devido à forma como a defendiam e a seguiam nos teatros da época. Com isso, o termo baderna surgiu no dicionário em 1875, cinco anos após a morte da dançarina.
A definição do verbete 'baderna', portanto, era sinônimo de desordem, confusão, ou bagunça. Um dos legados que Marietta deixou ao longo de sua história de vida e como artista.
Viúva aos 34 anos, ela passou um tempo longe dos palcos. Em 1862, se apresentou na França, no Théatre imperial Châtelet (em Paris) com Les Clowns Du Diable, na opereta Rothomago, o país das fadas. Esteve também no Grand Ballet Des Dentelles e no Grand Théatre de Bordeaux.
No Rio de Janeiro, Baderna constituiu família com o Maestro Gioacchino Giannini (Joaquim Giannini), tendo quatro filhos: Antonio, Henriqueta, Fanny e Mario. Foi sepultada no Cemitério de São Francisco Xavier no dia 4 de janeiro de 1892 e deixou um legado importante de resistência e amor à arte.
Os looks da cantora Anitta chamaram a atenção no carnaval de 2024 e teve como tema 'Guerreiras', homenageando mulheres fortes e inspiradoras. Entre elas, esteve Marietta Baderna: 'Eu estou de Marietta Baderna. E a mulher por trás dessa expressão, né? Baderna. É uma revolucionária', disse a artista.
Depois de longos anos de pesquisa, o escritor italiano Silvério Corvisieri publicou uma biografia de Marietta Baderna, que foi lançada no Brasil em 2011.
No último carnaval, a União da Ilha do Governador levou para a Marquês de Sapucaí o enredo: “Doum e Amora: crianças para transformar o mundo!” O tema foi inspirado livremente no livro “Amoras”, do rapper Emicida, e em demais contos infantis do universo da Literatura Negra brasileira.
Apesar do bom desfile, elogiado pela crítica especializada, a escola insulana não conseguiu disputar o título e ficou apenas na 7ª colocação. Na ponta da tabela, a Unidos de Padre Miguel retornou ao Grupo Especial após 52 anos.
A agremiação foi fundada em 7 de março de 1953 pelos amigos Maurício Gazelle, Quincas e Orphylo, que estavam na Estrada do Cacuia, principal local de desfile do carnaval da Ilha do Governador. Ao longo da história, se tornou uma das escolas mais queridas, com enredos alegres e sambas emblemáticos.
Um dos grandes nomes da história da escola foi o ex-intérprete Aroldo Melodia, que cantou sambas que entraram para a história do carnaval carioca. Além do seu filho, Ito Melodia, que seguiu o caminho do pai e também tem identificação com a escola, apesar de atualmente defender a Unidos da Tijuca, e o eterno Quinho.
Mesmo com os bons desfiles, a União da Ilha jamais foi campeã do Grupo Especial. Seu melhor resultado foi em 1980, quando foi vice-campeã com o enredo 'Bom, bonito e barato'. Na foto, o desfile de 1977, com o enredo 'Domingo'
Entre os sambas lendários da União da Ilha, estão 'Domingo' (1977), 'O Amanhã' (1978), 'É hoje' (1982), Festa Profana (1989), 'De bar em bar, Didi, um poeta' (1991), Fatumbi - A ilha de todos os santos' (1998), entre outros.
A escola foi rebaixada em 2020 e, desde então, ainda não conseguiu retornar ao Grupo Especial. Em 2025, a aposta em um enredo rico e pautado em uma personagem marcante, para tentar retornar à elite do carnaval carioca. Na foto, o desfile de 2014, quando a escola ficou na 4ª colocação.