Membro da Academia Brasileira de Letras, Cicero havia sido diagnosticado com Alzheimer e se submeteu a suicídio assistido no país europeu.
Ele deixou uma carta de despedida onde explica a decisão. O texto foi repassado a amigos do poeta pelo marido de Antonio Cicero, o figurinista Marcelo Pies.
De acordo com o jornal “Folha de S.Paulo”, antes de distribuir as cartas Pies enviou mensagem comunicando que Cicero vinha planejando a morte assistida há algum tempo e que pediu para ser cremado.
“Fomos a Paris por uns dias nos despedir da cidade que ele tanto admirava”, completou o figurinista.
No início da carta de despedida, Antonio Cicero diz: 'Queridos amigos, encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi…”
No texto, Cicero revela que já não conseguia mais escrever poemas e nem mais se concentrar nas leituras. “Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los”, diz em um trecho, referindo-se aos amigos.
“Como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade. Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!', diz a parte final da carta.
Cicero submeteu-se à morte assistida na Associação Dignitas, na cidade de Zurique. O procedimento auxilia pessoas que padecem de problemas sérios de saúde ou doença terminal e estejam em condições de decidirem sobre cuidados e tratamentos.
A legislação da Suíça permite o suicídio assistido desde 1942 para qualquer cidadão, nascido ou não no país.
No procedimento, é entregue à pessoa uma substância letal, que ela ingere ou aplica nela mesma com uma seringa.
A morte assistida é diferente da eutanásia. Nesta última, o médico aplica a dose de medicamentos que levam à morte do paciente. A eutanásia (“assassinato a pedido da vítima”) não é permitida pela legislação da Suíça.
Outros países permitem a morte assistida e até mesmo a eutanásia. Colômbia e Canadá, por exemplo, admitem ambas desde que o paciente sofra de uma doença terminal.
Bélgica, Holanda e Luxemburgo são países europeus que também autorizam as duas formas de suicídio.
No Brasil, tanto a eutanásia quanta a morte assistida são proibidas, aparecendo como práticas ilegais pelo Código Penal.
Nascido no dia 06/10/1945, no Rio de Janeiro, Antonio Cicero foi uma importante personalidade da cultura brasileira. Com atuação em diversas áreas, da crítica literária e poesia à música, ele ocupava a cadeira 27 da Academia Brasileira de Letras (ABL) desde 2018.
Formado em filosofia, ele terminou o curso na Universidade de Londres, na Inglaterra, quando estava exilado no fim dos anos 60 por conta da Ditadura Militar.
Antonio Cicero começou a escrever poesias na juventude, mas sua criação passou a ficar conhecida pelas parcerias musicais com a irmã Marina Lima, importante cantora da MPB.
Sucessos de Marina, como “Fullgás”, “À Francesa”, “Deixe Estar” e “Pra Começar” têm letra de Antonio Cicero.
O poeta foi parceiro de outros ícones da música brasileira, como João Bosco, Lulu Santos (“O Último Romântico”) e Adriana Calcanhoto.
“Cicero foi meu melhor amigo, a pessoa mais correta que conheci. O afeto de amizade mais límpido que se possa imaginar. E uma inteligência luminosa”, escreveu o compositor e cantor Caetano Veloso em seu perfil no Instagram.