A jovem de 18 anos estava sepultada com uma foice sobre o pescoço e um cadeado no dedo do pé, medidas usadas para impedir que ela “retornasse dos mortos” – uma prática de proteção contra supostos “vampiros”. O corpo da jovem tinha deformidade física e a comunidade pode ter considerado 'anormal'.
Enterrada com um gorro de seda que indicava seu status elevado, 'Zosia', como foi chamada, teve seu rosto reconstruído digitalmente, revelando olhos azuis e cabelos curtos.
A escavação revelou um cemitério de pessoas marginalizadas, onde outros indivíduos também foram enterrados com medidas cautelares semelhantes, como pedras no peito e moedas na boca.
Na Polônia, há uma lenda de que no século 17 regiões eram assoladas por 'revenants' ou 'renascidos', seres semelhantes a vampiros que atacariam vivos e causariam caos nas casas.
Esses relatos eram tão comuns que várias medidas eram tomadas para evitar a reanimação dos cadáveres, como arrancar seus corações, pregar seus corpos nas sepulturas e usar estacas nas pernas.
Em 1746, um monge chamado Antoine Augustin Calmet publicou um tratado para distinguir os verdadeiros 'renascidos' de fraudes.
Recentemente, arqueólogos da Universidade Nicolau Copérnico encontraram a primeira evidência física de uma criança 'renascida' em um cemitério na Polônia.
A criança, que teria cerca de seis anos no momento da morte, foi enterrada de bruços com um cadeado de ferro sob o pé esquerdo para evitar que assombrasse sua famÃlia e vizinhos.
“O cadeado teria sido trancado até o dedão do pé. A criança foi enterrada de bruços para que, se voltasse dos mortos e tentasse ascender, mordesse a terra”, disse o arqueólogo-chefe do estudo, Dariusz Poli?ski.
A descoberta tem ajudado os historiadores a entenderem mais sobre as crenças e práticas da época em relação a esses seres.
Algum tempo após o sepultamento, a tumba foi profanada. Todos os ossos foram removidos, exceto os das partes inferiores das pernas.
O lugar, que funcionava como um cemitério improvisado destinado para pessoas menos favorecidas, foi encontrado há 18 anos sob um campo de girassóis, situado na encosta de uma colina.
Segundo registros locais, o cemitério não estava associado a uma igreja ou a um terreno consagrado. Cerca de 100 sepulturas já foram descobertas no local.
No fim da Idade Média, especialmente na Polônia, era tradição colocar cadeados nas sepulturas. O maior achado deste tipo foi na cidade de Lutomiersk, onde quase 400 das 1.200 sepulturas investigadas continham cadeados.
A tradição persistiu nas comunidades judaicas da Polônia pelo menos até a Segunda Guerra Mundial.
Martyn Rady, historiador da University College London, ressaltou que a mulher e a criança não devem ser categorizadas como vampiras.
Eles elaboraram relatórios que chegaram até a ser publicados em revistas médicas da época. “Eles deixaram bem claro que, na lenda popular local, o vampiro tinha três características: era um fantasma, alimentava-se dos vivos e era contagioso”, relatou o historiador.
As lendas polonesas mencionam dois tipos de 'renascidos'. O primeiro é o upiór, que mais tarde foi substituído pelo termo wampir e se assemelha ao Drácula representado por Béla Lugosi no filme de 1931.
O segundo é a strzyga, que é mais parecida com uma bruxa malévola que ataca os humanos, podendo comê-los ou beber seu sangue, de acordo com o folclorista Al Ridenour.
A prática dos cadeados pode ser vista como uma tentativa de garantir que os mortos permanecessem em paz, como expresso na citação de Lugosi em 'Drácula': 'Morrer, estar realmente morto, deve ser glorioso'.